Seguidamente escuto pessoas afirmando que “tudo aquilo que eu tenho, eu conquistei”. Como cristão e pessoa de fé, devo discordar desta afirmação, mesmo reconhecendo que a pessoa que assim fala ralou muito para chegar onde está.
A maior riqueza que nós temos é a vida. E esta, nós não conquistamos, mas recebemos: é um DOM. Se temos algum mérito é havermos preservado a vida, cuidando da nossa saúde e cultivando hábitos sadios.
Do DOM da vida que recebemos, nos vem o compromisso de cuidar dela. A Campanha da Fraternidade de 2020 não deixa dúvidas: a vida é DOM e COMPROMISSO. O Papa Francisco diz que nós somos “guardiões da Criação”. O texto da Campanha da Fraternidade diz que “o olhar da indiferença gera ameaças à vida”. Por isso, de cada um de nós se pedem ações que ajudem a manter e melhorar as condições de vida no Planeta Terra.
Para explicitar o compromisso com a vida, a CNBB se vale da parábola do Bom Samaritano (Lc 10,25-37), com a qual Jesus mostra ao Doutor da Lei quem é o seu próximo. Tudo está centrado no “olhar”. O samaritano “viu, sentiu compaixão e cuidou dele”. O sacerdote e o levita viram e passaram adiante. Enquanto o olhar do samaritano foi um olhar de compaixão e compromisso, o olhar do sacerdote e do levita foram olhares típicos de quem diz: “isto não é comigo”. E é esta indiferença que faz com que existam crianças abandonadas, adolescentes fora da escola, jovens drogados, mulheres violentadas, idosos abandonados, pessoas deprimidas, arroios e rios poluídos, alimentos sobrecarregados de agrotóxicos, direitos humanos desrespeitados e inúmeras falsas notícias circulando nas redes sociais.
De outro lado, felizmente também existem pessoas que, a exemplo do Bom Samaritano, veem as situações de sofrimento, se compadecem e agem. São aquelas pessoas que fazem trabalhos voluntários, denunciam as injustiças, se solidarizam com os que sofrem, participam de conselhos, sindicatos, associações e movimentos populares, promovem ações para deter a degradação do meio ambiente, combatem as falsas notícias e colaboram com as instituições filantrópicas.
Conforme o Texto Base da Campanha da Fraternidade, “nossa vida assume sentido quando abrimos nosso coração ao outro, de modo especial ao outro que sofre, que é pobre, abandonado e esquecido”. A Páscoa “nos ensina a romper os túmulos da indiferença e do ódio e ressurgir para o zelo, o cuidado e a solidariedade, incluído o cuidado com a Casa Comum”. O espírito deve ser o amor, pois “quem ama não julga, não acusa, não divide! Quem ama, cuida, acolhe, integra, dialoga, suporta, se compadece. Nossas mãos não podem estar fechadas para socar e agredir. Elas têm de estar abertas para apoiar e cuidar”.
A proposta da Campanha da Fraternidade é assumirmos o compromisso de cuidar da vida em todas as suas formas e expressões. “Para isso, é preciso descer da montaria e oferece-la a quem está ferido à beira do caminho”. Não podemos agir como Pilatos que, “mesmo consciente da inocência de Jesus não foi capaz de agir em favor da vida do Salvador”. Por vezes, dizia Santa Teresa de Calcutá, “sentimos que aquilo que fazemos não é senão uma gota de água no oceano. Mas o oceano seria menor se lhe faltasse uma gota”. Conforme o Papa Francisco, “onde quer que você esteja, construa! Acredite firmemente em todas as pessoas que trabalham pelo bem”. A Campanha da Fraternidade de 2020 tem muito a nos ensinar.
*Pe. Roque Hammes – Coordenação de Pastoral da Diocese de SCS