LUANA CIECELSKI
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Em Santa Cruz do Sul, assim como no restante o Rio Grande do Sul, as principais demandas que chegam às varas trabalhistas da cidade são relacionadas às verbas rescisórias não pagas, ou pagas em menor quantia. Essa constatação foi divulgada na tarde da última quarta-feira, 8 de março, no próprio Foro Trabalhista, quando foi realizada uma correição ordinária no local. A correição é uma inspeção anual feita pelo Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS), e em 2017, o trabalho foi realizado pelo vice-corregedor do TRT-RS, o desembargador Marçal Henri dos Santos Figueiredo, ex-juiz da comarca de Santa Cruz do Sul.
De uma forma geral, Figueiredo aponta que o resultado da correição foi positivo. Segundo ele, em comparação com outras varas de médio porte, aquelas que possuem entre 1 mil e 1,5 mil processos em um ano – que é o caso das três varas locais – o rendimento do trabalho está bem dentro da média. Entraram mais processos do que foram concluídos, mas isso é normal porque sempre há um estoque de processos que ficam de um ano para o seguinte, já que nenhum processo pode ser arquivado enquanto não há uma solução definitiva, o que depende não apenas do juiz, mas também das partes envolvidas.
Figueiredo aponta porém, que está um pouco abaixo da média o índice de acordos feitos nas varas trabalhistas de Santa Cruz. “Estamos abaixo de 40% nesse índice. Em Estância Velha, uma região de curtume e calçadista [e que é do mesmo porte das varas de Santa Cruz], o índice de acordo é de 80%”, aponta. Essa questão, porém, deverá ser trabalhada no próximo mês de maio, quando será realizada uma Semana Nacional de Conciliação. “Para essa semana, todos os servidores receberão treinamentos e cursos, e então, eles poderão aplicar esses conhecimentos aqui nas varas de Santa Cruz. Existe toda uma técnica de convencimento. Não é uma questão de abrir mão de direitos, mas de compreender que nem sempre levar um processo adiante é vantajoso”.
Fazer ou não fazer o acordo, porém, também é uma questão cultural. Marçal conta, com base em sua experiência como juiz, que muitas empresas utilizam a justiça do trabalho para fazer seu capital de giro. “Elas demitem o empregado e dizem para ele procurar os direitos dele na justiça. Aí o empregado vem até aqui dizendo que foi demitido e a empresa conta uma história totalmente diferente. Dizem que foi o empregado que pediu demissão, por exemplo, e ficam empurrando o processo com a barriga. Enquanto o processo está tramitando a empresa não pagou nada, ela não foi multada em nada, então ela aplica aquele dinheiro e ele vai rendendo”. Marçal lembrou também que por outro lado os juízes, em sua maior parte, conhecem as empresas da comarca em que atuam. “A gente conhece o perfil dessas empresas. Quando mais de um trabalhador vem aqui reclamar da mesma coisa, a gente reconhece um padrão.”
O desembargador apontou ainda que todas as varas estão com a lotação completa de servidores – em torno de 11 -, que os juízes são bastante experientes. “As varas de Santa Cruz estão bem servidas de juízes e de servidores. É um grupo de trabalho bem qualificado”.
Outras demandas
Além das verbas rescisórias não pagas, outras demandas muito comuns em Santa Cruz do Sul são as reclamações de horas extras e adicional de insalubridade não pagos. Além disso, Figueiredo aponta os acidentes de trabalho como outro dos direitos bastante reclamados, assim como pedidos de equiparação de salários em uma mesma função. “É comum acontecer com mulheres. Elas devem receber o mesmo salário que um homem pela mesma função. Isso nem sempre ocorre”.
Sobre a questão do trabalho escravo, Figueiredo aponta que não é comum, mas que o Estado ainda possui, sim. “Muitos têm o RS como um Estado politizado, de trabalhadores que herdaram uma cultura europeia, mas existe trabalho escravo ainda, sim. E eu não diria que é pior, mas com certeza mais traumático, mas se tem também trabalho infantil”. Nesses casos a justiça precisa percorrer um caminho diferente, porque a pessoa que está passando por essa situação normalmente está à mercê do empregador. É necessário então, que uma denúncia seja feita no Ministério Público do Trabalho, que é quem vai autuar esse empregador e solicitar que os direitos desses empregados sejam reconhecidos. “É feito o Termo de Ajuste de Conduta. Se ele não for cumprido, aí o processo vem para a justiça do trabalho e aí um juiz vai determinar o que precisa ser feito”, explica. Por isso ele lembra a importância das denúncias.
Por fim, Marçal apontou ainda que, de uma forma geral, em Santa Cruz do Sul, assim como no Estado, a maior parte dos processos trabalhistas abertos é considerado procedente, ou seja, de uma forma geral, os trabalhadores que reclamam seus direitos, têm ganho de causa.
O Foro Trabalhista da comarca de Santa Cruz do Sul está localizado na Rua Prudente de Moraes, 603, no bairro Goiás, e abrange os municípios de Arroio do Tigre, Boqueirão do Leão, Candelária, Encruzilhada do Sul, Estrela Velha, Herveiras, Ibarama, Lagoa Bonita do Sul, Mato Leitão, Pantano Grande, Passa Sete, Passo do Sobrado, Rio Pardo, Santa Cruz do Sul, Segredo, Sinimbu, Sobradinho, Vale do Sol, Venâncio Aires, Vera Cruz. O juiz diretor do foro é Celso Fernando Karsburg.
O que é uma correição?
Uma correição, de acordo com o próprio desembargador, nada mais é do que uma auditoria. “Como os sistemas hoje funcionam pela informática nós dispomos dos dados das varas de Santa Cruz no tribunal. Pra ver os processos, números, andamento deles, as datas de audiência, etc. E na data da correição o que a gente faz é uma checagem de dados. A gente verifica se aquilo que a informática me mostra lá, corresponde à realidade aqui”.
A correição também visa verificar as estruturas do fórum, as condições de trabalho dos servidores, a necessidade de reformas estruturais, de contratações, de realização do treinamento por parte de alguns trabalhadores do fórum. A correição é feita uma vez por ano em cada uma das varas do Rio Grande do Sul. “É uma oportunidade que a justiça da capital tem de vir até o interior, até as comunidades”.
Cada vez mais ágil
Implantado em 2014 em Santa Cruz do Sul, o sistema do Processo Judicial Eletrônico (PJE-JT) tem tornado mais ágil o trabalho dos servidores, juízes e advogados e facilitado numa resolução mais rápida dos processos, e segundo a análise de Figueiredo, está funcionando muito bem nas varas da cidade. “Era como andar em um Gol 1000 e passar a andar numa Ferrari. O sistema de informática tem custos, claro, porque ele precisa ser atualizado constantemente, mas ele evita muitas coisas. As notificações judiciais que antes eram enviadas pelo Correio, agora podem ser enviadas pelo programa para os advogados, e quando o advogado acessa, a vara consegue saber e começar a contar o prazo. E em Santa Cruz está funcionando tudo certinho. Todos estão bem adequados ao sistema”.
A ideia, porém, é de que mais evoluções aconteçam em breve. “Já existe um para gravar e filmar as audiências. O sistema inclusive já é utilizado na operação Lava Jato em Curitiba”, conta Marçal. Segundo ele, além de registrar o julgamento, o sistema também tornaria dispensável a Secretária de Audiência, porque ele próprio faz um resumo transcrito do que ocorreu. “Não sei exatamente quando o TST conseguirá implantar, porque isso depende do fornecimento de internet, e muitos rincões pelo país e pelo estado ainda não possuem internet disponível como nós, mas é para um futuro breve”, disse.
PROCESSOS
2014 1816 1140
2015 1295 861
2016 1170 1119
2014 1202 1055
2015 1360 1018
2016 1115 935
2014 1223 935
2015 1319 1123
2016 1152 1048