Guilherme Athayde
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Em visita a Santa Cruz do Sul para apoiar a reestruturação de seu partido no município, a vereadora em Porto Alegre já é uma referência no Estado na luta pelas causas sociais, dos direitos das mulheres e na defesa dos trabahadores e trabalhadoras. Com 14.630 votos, Fernanda Melchionna (PSOL), que aos 33 anos já está em seu terceiro mandato como vereadora na capital gaúcha, é crítica e forte oponente aos governos do PMDB, tanto na esfera Federal quanto no Palácio Piratini. Também realiza um trabalho de oposição ao prefeito Nelson Marcehzan Jr (PSDB). em Porto Alegre. Ela atendeu a reportagem na Câmara de Vereadores de Santa Cruz do Sul e falou sobre a conjuntura política atual.
‘Riovale’ – Qual a importância de ser a mais votada em Porto Alegre para a representação da mulher na política?
Fernanda – Acho que a participação das mulheres na política ainda é pequena frente ao número de mulheres que nós somos na sociedade. Isso é fruto de uma sociedade extremamente machista e patriarcal, que sempre relegou as mulheres aos espaços privados e não aos espaços públicos. Claro que no presente tem outros temas. A gente vê nas ocupações de escolas que as mulheres são a maioria, assim como nas associações de bairros, mas isso não se reverte na política ainda, porque boa parte do regime, da “partidocracia” podre que existe é extremamente caciquista.
As mulheres sofrem com a tripla jornada de trabalho, com o cuidado dos filhos que ainda é tido como uma tarefa iminentemente feminina. É um conjunto de coisas, é preciso criar medidas para enfrentar o machismo e empoderar as mulheres. Nós do PSOL temos muito orgulho de ter medidas no partido e figuras públicas como a Luciana Genro que são parte desta construção da luta em defesa dos trabahadores mas também em defesa das mulheres, do combate à violência de gênero, do combate à cultura do estupro, enfim, isso tem um peso simbólico, de a mais votada ter sido uma mulher, tem um peso muito importante na luta das mulheres, e mais do que isso, numa situação tão difícil, de tantos ataques, e de uma velha esquerda que se corrompeu ao ‘modus-operandi’ do regime político como é o caso do PT, ter uma nova esquerda que seja vitoriosa numa eleição municipal para a vereança, mostra que é possível fazer política sem se vender, ajudando a organizar a luta das pessoas, que é um reconhecimento à luta pela moradia popular, em defesa das mulheres, dos LGBT’s, das lutas anti-racismo, em defesa da democracia real, da luta pelos trabalhadores que eu expressei nos últimos oito anos na Câmara de Vereadores.
Eu vejo como um reconhecimento desse trabalho de luta que nós temos em Porto Alegre e no Estado. E mais do que isso, vejo como um desafio, porque essa votação faz com que o nosso mandato seja ainda mais comprometido com as demandas populares e com as causas sociais.
‘Riovale’ – Qual sua visão sobre a situação econômica do Estado e do País?
Fernanda – Esse plano de recuperação é um plano de desmonte do Estado. Nós estamos vivendo a crise no Rio Grande do Sul justamente pelo acordo que foi feito entre o (ex-presidente) Fernando Henrique (PSDB) e o (ex-governador do RS), Antônio Brito (PMDB), em que o Estado contraiu um empréstimo com juros altíssimos e regulados pelo IGPDI (Índice Geral de Preços de Disponibilidade Interna), que fez com que uma dívida que começou com (R$) 9 bilhões, se pagou todos os anos e chegou a 53 bilhões.
Esse projeto de recuperação, que o governo ilegítimo do Temer, que não tem nenhuma condição moral de seguir, é preciso derrubá-lo, mas, combatendo qualquer manobra da elite de colocar um governo por eleições indiretas, o governo Maia (DEM, Presidente da Câmara dos Deputados), que é para acelerar as reformas contra os trabalhadores e ao mesmo tempo não chamar o povo a participar. Nós estamos defendendo eleições gerais, mas o que o governo ilegítimo do Temer está propondo é um enterro dos Estados. Primeiro que não se reconhece o passivo, que é o que foi pago a mais com esses juros ilegítimos. O Estado do Rio Grande do Sul já não deve mais à União. Essa relação de agiotagem que foi construída é um verdadeiro escândalo, e mais do que isso, esse projeto de desmonte prevê uma série de limitações, como por exemplo, no reajuste do funcionalismo, no investimento nos Estados, prevê uma série de privatizações, ou seja, é mais um projeto de chantagem desse projeto neoliberal no Brasil, de colocar o Estado do Rio Grande do Sul numa política de desmonte, de perseguição aos serviços públicos, de ataque as áreas essenciais e de entrega dos nossos recursos para interesses privados, que é o que o Sartori tem tentado fazer: a venda da Companhia Riograndense de Mineração, a venda da CEEE, o (Henrique, Ministro da Fazenda) Meirelles falou em vender o Banrisul, existe todo um movimento em favor da defesa do nosso banco.
A tentativa do Sartori, a partir da luta dos trabalhadores, da ação do Ruas (deputado Estadual pelo PSOL) e de outros deputados na Assembleia, se perdeu a base e não conseguiu aprovar, depois tentou o plebiscito, é uma forma de tentar vender os nossos recursos naturais, no caso da energia entregar pros chineses, enfim, vender os recursos estratégicos do Estado e ao mesmo tempo entrar nesse programa que vai seguir endividando o Estado e ao mesmo tempo desmontando a possibilidade de termos um Estado forte, que invista naquilo que é importante para as pessoas, porque quando a gente fala em serviços públicos, em banco público, além da questão de controle sobre recursos estratégicos, como é a energia, nós também estamos falando da questão social. Um banco público tem uma função social enorme, inclusive, deveria ser mais usada essa função social do que hoje.
Na verdade o Sartori busca desmontar o Estado nesse projeto que tem alinhamento com o governo ilegítimo do Temer, e também com algumas prefeituras, como é o caso de Porto Alegre, onde temos um governo bem neoliberal. Então é preciso derrotar esse projeto nas ruas, com a mobilização dos servidores, com o funcionalismo, e derrotar com um projeto político capaz de apresentar uma alternativa para o Brasil, que passa por taxar as grandes fortunas, com a auditoria da dívida pública, mudar essa lógica tributária que tributa mais o povo trabalhador e menos os bancos. Que é uma coisa escandalosa esse tripé que massacra o povo, mas também mudar a questão do Estado, que significa garantir e reconhecer que o Estado não seja mais vítima de agiotagem, e também que se busque os recursos que foram perdidos com a Lei Kandir, que fez com que o Estado perdesse bilhões de reais que poderiam ser usados para vencer essa crise estrutural que nós estamos passando e ao mesmo tempo pra investir em educação, que está catastrófica, a saúde, melhorar a capacidade de investimentos e de melhorias de investimentos públicos para a população.
‘Riovale’ – É um momento de dificuldade para a garantia de direitos dos trabalhadores?
Fernanda – É um momento muito difícil, pelo impacto da crise econômica de modo global. O Brasil está com um índice de desemprego de quase 14 milhões de pessoas, o que é muito ruim para a classe trabalhadora, para o povo em geral, que está sofrendo com essa crise que foi gerada pelos governos que governam para os ricos e para os próprios políticos. Nós temos uma casta política que está sendo desnudada pelas investigações da Lava Jato, que mostram essa relação promíscua entre empresas privadas e políticos, e nós do PSOL aliás, temos muito orgulho de ser o único partido no Congresso que não está envolvido em nenhuma das investigações da Lava Jato.
Então é uma crise gerada pelos grandes, que querem passar para a classe trabalhadora. Nessa esteira veio também a questão da reforma trabalhista, que rasga a CLT e permite que o negociado valha sobre o legislado, tornando o trabalhador mais vulnerável frente as relações de trabalho, a reforma da previdência, que torna muito difícil a aposentadoria de milhões de brasileiros, a lógica é que boa parte das pessoas morram antes de se aposentar. Então é um escândalo essa reforma, ou a PEC 55, que congelou gastos públicos durante os próximos 20 anos, é uma tentativa das elites de atacar os nossos direitos nessa combinação de um governo que não tem moral nenhuma para seguir. O governo Temer é o mais impopular na história, aliás, o primeiro que tem um presidente denunciado pela Procuradoria-Geral da República, isso é um escândalo completo. Mas ao mesmo tempo, além de lutar contra o Temer, porque, na medida em que precisamos defender empregos, direitos, CLT, previdência, é preciso derrotar esse governo e na mesma medida precisamos derrotar as manobras da burguesia, das elites, que querem, a partir de uma série de medidas antidemocráticas, criar um governo tampão com eleições indiretas, via Rodrigo Maia, para dar estabilidade aos interesses deles e barrar as investigações da Lava Jato e avançar sobre a retirada de direitos. É preciso nesse momento unir a luta social contra as reformas com a luta política contra esse governo. É muito importante a organização em sindicatos, a mobilização e a organização da classe trabalhadora, mas também a busca de transformar o sujeito social em sujeito político, por isso estamos muito contentes com essa construção, a retomada do PSOL em Santa Cruz, porque é fundamental que haja um pólo partidário com essa independência política capaz de defender os interesses do povo.