Em Blumenau, um grupo de brasileiros se reuniu para assistir ao jogo entre Alemanha e Gana e torcer pela seleção alemã. Vestidos com roupas e acessórios típicos usados na Oktoberfest, os torcedores acompanharam a partida tomando um bom chope e em clima de comemoração. Segundo um dos organizadores, dá para conciliar a torcida pela seleção alemã e brasileira. “A gente torce pelo Brasil sim. A torcida é grande”, mas admitiu que a situação irá se complicar caso as duas equipes se enfrentem na final do Mundial. “Eu prefiro que vá um, ou outro. Se forem os dois, não sei. Não vamos saber para quem torcer, mas vamos ficar felizes por quem ganhar”.
Esse registro está no último Boletim Brasil-Alemanha, cujo foco são acontecimentos relacionados aos dois países. Aproveito-o apenas como ponto de partida para uma breve reflexão sobre a identidade dos descendentes de povos europeus (alemães, italianos, portugueses e outros) no Sul do Brasil.
Não conheço pesquisas de opinião que investiguem por quem torce a maioria dos descendentes de imigrantes, mas na nossa e em outras regiões coloniais sulinas se colhe no dia a dia a impressão de que a grande maioria torce pela seleção brasileira e que muitos têm simpatia especial pela seleção do país de seus antepassados. Diferente do caso do grupo de torcedores de Blumenau, parecem ser poucas as pessoas que ficam em dúvida sobre quem torcer no caso de uma final entre a nossa seleção e “a outra”. A imensa maioria torce pelo Brasil.
Em décadas anteriores esse quadro era outro. A formação do sentimento de brasilidade entre os descendentes de alemães sofreu uma série de obstáculos ao longo da história: o abandono dos colonos no início do processo de Colonização, o tratamento político desigual dado aos luteranos em relação aos católicos e, sobretudo, a perseguição aos descendentes de alemães durante a Campanha de Nacionalização, promovida pelo Estado Novo no contexto da 2ª Guerra, entre outros. Face ao tratamento desrespeitoso das autoridades brasileiras, muitos dos imigrantes e seus descendentes tinham fortes motivos para continuarem espiritualmente ligados à pátria dos ancestrais.
Esse panorama mudou nas últimas décadas do século XX. A legislação e as políticas públicas de caráter universal homogeneizaram em grande parte o sentimento de cidadania entre as gentes de pele clara. O tratamento recebido pelo cidadão no judiciário, no SUS, na Previdência ou nos órgãos policiais tem pouco a ver com o fato de ser descendente desse ou daquele povo europeu.
O sentimento de brasilidade é uma questão bastante bem resolvida nas antigas colônias de imigrantes europeus no Sul do Brasil.Nelas torce-se pela seleção brasileira com a mesma intensidade das outras regiões do Brasil. E tal qual nas outras regiões, há os que “secam” a nossa seleção com receio de que um possível título mundial favoreça o governo. Mas, tal qual nas outras regiões, a maioria não cai nessa confusão por saber que a vitória no futebol se decide em julho e a vitória nas urnas se decide em outubro.