Luciana Mandler
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Anualmente, o salário mínimo é reajustado. No primeiro dia de 2022, passou de R$ 1.100,00 para R$ 1.212,00. Para o cálculo, o governo federal utilizou a inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) de 2021, que totalizou 10,02%, considerando os acumulados de janeiro a novembro e a projeção para dezembro. Para as remunerações vinculadas ao salário mínimo, os valores de referência diário e por hora ficaram em R$ 40,40 e R$ 5,51, respectivamente.
Apesar do aumento, este valor do mínimo pode e é considerado digno e justo para os trabalhadores? Para fazer essa reflexão e análise, o Riovale Jornal contatou o economista Silvio Cezar Arend, professor da Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc). Ele sublinha que, nos últimos anos, o salário mínimo tem sido corrigido somente pela inflação, sem ganhos reais. “Com isso, ‘mal e mal’ se consegue manter o poder aquisitivo de alguns anos atrás, sem contar que a correção ocorre depois de um ano de elevação de preços, ou seja, ao longo do ano vão se acumulando perdas”, observa. Ainda de acordo com Arend, a reposição da inflação de 2021 é suficiente para cobrir a elevação da cesta básica nacional em Santa Cruz do Sul, que alcançou 7,687% de janeiro do ano passado a janeiro deste ano, mas, se considerar que em seu pico o conjunto de 13 produtos pesquisados chegou a custar R$ 574,67, esta correção do salário mínimo não basta para recompor o poder aquisitivo. (Leia mais sobre o custo da cesta básica em Santa Cruz na página 14 desta edição)
“Podemos também comparar com o preço dos combustíveis ou do gás de cozinha. Dependendo do período de comparação, as elevações de preço destes produtos superam 30%”, aponta o economista. “A correção do salário mínimo mal é suficiente para repor o custo com a alimentação no domicílio e, se somarmos a elevação do gás de cozinha (que não compõe a cesta básica), é claramente insuficiente. Ou seja, é preciso escolher entre comprar alimento ou cozinhá-lo”, contrasta. Hoje, as duas coisas não cabem mais no orçamento. Isso explica – junto com o desemprego e a queda da renda – o elevado número de famílias que não conseguem se alimentar adequadamente no País.
Arend explica que o salário mínimo necessário é calculado a partir do custo da cesta básica, próximo como uma regra de três. “Grosso modo, o gasto com a alimentação no domicílio de uma família não deveria exceder a 30% ou 33% do orçamento familiar”, argumenta. Desta forma, para Santa Cruz do Sul, o salário mínimo necessário deveria ter sido de R$ 4.516,84 no mês de dezembro de 2021, para ser gasto em janeiro de 2022. Em capitais como Porto Alegre e São Paulo, este valor ultrapassa R$ 5 mil, calcula o economista.
“O tamanho da gravidade da situação é compararmos com a tabela do Imposto de Renda Pessoa Física (não reajustada há mais de quatro anos), cujos rendimentos acima de R$ 1.903,98 já pagam IRPF”, aponta Silvio Arend. “Ou seja, a situação de quem recebe somente um salário mínimo é de extrema dificuldade de manutenção de sua família, e mesmo para quem não tenha família para sustentar, exigindo escolhas muito difíceis sobre quais itens deixar de comprar – alimento, vestuário, transporte, moradia”, lamenta. “Está cada vez mais precária a situação de vida da população. Considerando os cálculos acima, é impossível manter-se com apenas um salário mínimo”, arremata.