Desde o seu surgimento nos anos 30, o basquete de Santa Cruz do Sul sempre esteve em evidência entre os homens, sendo uma história recheada de grandes conquistas que potencializaram o esporte no Município. Entre as mulheres, a trajetória é mais recente, com a prática do basquete feminino incentivada inicialmente no Colégio Mauá e que foi potencializada com equipes formadas pelo Colégio Marista São Luís e Escola Estadual Ernesto Alves de Oliveira para disputa de competições estudantis.
Andrea Fabiane Bublitz, 43 anos, foi uma das atletas que participou daquele que é considerado o início do basquete feminino de Santa Cruz. Aluna do São Luís, ela se recorda que o time feminino juvenil do educandário, treinado pelo professor Clairton Wacholz, o Xis, sagrou-se bicampeão do Campeonato Gaúcho Escolar nos anos de 1988 e 1989. “Realizávamos atividades do basquete interno na escola e realizamos esses jogos onde fomos bicampeãs estaduais escolar. Tínhamos rivalidade com as meninas de Osório e vencemos elas duas vezes. Foi muito legal”, recorda a ex-atleta.
A base campeã estadual escolar do São Luís, reforçada com alunas do Mauá e do Ernesto Alves, orientadas pelo professor Reginaldo Soares, que na época era professor do Colégio Mauá, deu início ao time de basquete feminino da Sociedade Ginástica, sendo a primeira vez que um clube de Santa Cruz do Sul disputava o Campeonato Estadual Adulto de Basquete Feminino. “No colégio, a gente jogava basquete e disputava competições escolares municipais. Através do professor Reginaldo Soares, do Mauá, a gente teve a oportunidade de juntar esses times e começamos a treinar. Tínhamos uma equipe com estatura alta e foi muito marcante, pois através da escola, o clube se interessou por nós e começamos a disputar o estadual feminino”, conta Andrea.
Com poucos adeptos, o estadual feminino de basquete de 1990 foi disputado por quatro equipes naquele ano. A Ginástica disputava em formato de etapas e na final, disputada em Santa Cruz do Sul, venceu as equipes do Colégio São João, de Canoas, e Colégio Sinodal, de São Leopoldo, e perdeu para o Grêmio Náutico União, de Porto Alegre, sagrando-se vice-campeã estadual.
Após a conquista do vice-campeonato estadual, as atletas da Ginástica passaram a defender a Arcal/Corinthians, orientadas pelo técnico Juarez Franco, o Bola (já falecido), em que seguiram disputando o estadual feminino, obtendo o terceiro lugar no ano seguinte. “No Corinthians tivemos treinos mais intensos e fizemos uma participação bem legal. Disputamos jogos contra a Sogipa e contra Osório, onde já tínhamos uma rivalidade acirrada desde o tempo de colégio”, lembra a atleta. Andrea se recorda da convivência diária com Ary Vidal e os atletas do time masculino. “A gente saía da quadra e eles entravam para treinar. Às vezes jogava junto, batia bola junto, tudo observado pelo professor Ary. Treinávamos todos os dias e tínhamos uma relação de amizade e parceria com o time masculino, sendo um período bem marcante”. O time feminino do Corinthians existiu até 1995 e depois se dissolveu, com as atletas seguindo outros rumos na carreira.
Devido às boas participações no estadual, Andrea destaca que surgiram convocações para a seleção gaúcha e convites para atuarem em outros estados. “A Karina e a Aline foram jogar em São Paulo, a Cintia, Leticia e Anelise foram estudar fora. Para mim surgiu convites, mas tive medo de sair e não tinha essa ideia. Sempre fui mais caseira e acabei ficando em Santa Cruz”, salienta a ex-jogadora, que hoje trabalha como enfermeira obstétrica.
Andrea destaca que o time tinha patrocínio e apoio dos clubes e empresas para uniformes, mas que muitas vezes as próprias atletas custeavam as despesas para participar dos jogos. “Foi um período bem legal, onde começamos na escola e seguimos nos clubes. Foram os melhores anos da minha vida. A gente era uma grande família e aquele período nos enriqueceu, sendo importante para a nossa formação como ser humano com essa experiência”, finalizou.
Karina Knak, a santa-cruzense campeã panamericana de clubes
As participações no estadual feminino no início dos anos 90 abriu portas para as atletas santa-cruzenses receberem oportunidades de trilhar carreira na modalidade. Um dos principais destaques das equipes da Ginástica e Corinthians, Karina Knak, hoje com 44 anos, foi uma das primeiras atletas que recebeu convite para atuar fora do Estado. “A gente treinava, obteve o vice estadual com a Ginástica e após fomos para o Corinthians. O Marcel, que jogava na Arcal/Corinthians, tinha uma amiga treinadora de basquete que estava em Santa Cruz e assistiu ao nosso treino. No final, ela chamou eu e outra colega e fez o convite para a gente fazer um teste em São Paulo. Conversei com meus pais e acabei indo”.
O professor Reginaldo Soares lembra que, com apenas 14 anos, Karina despontou como principal destaque. “Após o estadual, a Karina seguiu para São Paulo, onde teve uma respeitada trajetória no basquete feminino ao atuar por várias equipes de ponta do Brasil”, lembra.
Em 1991, a atleta santa-cruzense foi jogar na Perdigão, de Jundiaí, no interior de São Paulo. “Me destaquei e logo fui convocada para a seleção brasileira juvenil. No time de Jundiaí joguei junto com a Alessandra, Rosangela e Jaqueline, jogadoras que se destacaram na seleção brasileira adulta”, relembra.
Após atuar pelo Jundiaí, a jogadora defendeu Guarulhos e Piracicaba, onde trabalhou com o técnico Barbosa, ex-seleção brasileira. “Em Piracicaba, eu era juvenil e acabei sofrendo uma lesão grave e tive que passar por cirurgia”, conta. Ao retornar às quadras, Karina atuou mais duas temporadas no Bauru, em que sagrou-se campeã panamericana de clubes em Honduras. “Isso foi em 1996. Joguei no time adulto contra vários times da América do Sul. Tinha vencido dois títulos paulistas e esse título pan-americano foi o principal que conquistei por estar representando o Brasil”, salienta.
As lesões atrapalharam novamente, e de forma precoce Karina precisou encerrar a carreira no basquete para se dedicar aos estudos, em que se formou como médica veterinária, profissão que exerce atualmente em Santa Cruz do Sul. Ao retornar para a cidade natal, em 2017, ela passou a integrar o Projeto Associação Meninas do Basquete como assistente técnica.
Ao avaliar a trajetória do basquete feminino santa-cruzense, a ex-jogadora salienta que a modalidade sempre careceu de um maior apoio com patrocínios. Ela elogia o trabalho do professor Reginaldo Soares, que ainda luta para manter o esporte através do projeto. A ex-jogadora destaca que procura auxiliar as jovens atletas com a experiência que viveu no esporte. “É legal que eu consigo passar a experiência que eu tive para estimular as meninas a jogarem e tentarem seguir carreira através do esporte”, salientando que o Município tem um grande potencial de crescimento na modalidade. “Em 2019 levamos cinco atletas para os Estados Unidos, recentemente tivemos atletas do projeto convocadas para a seleção gaúcha e a Betina (Bergallo) que vai jogar nos Estados Unidos. O esporte é muito bom por proporcionar oportunidades e novas experiências”. Em 2019, Karina voltou a jogar e hoje integra a Seleção Brasileira Master Feminina, que disputará o Panamericano e o mundial para atletas com 40 anos, competições que estão paralisadas devido à pandemia. “Tem bastante coisa legal ainda pela frente através do basquete”, finalizou.