Marx falava sobre “Exército Industrial de Reserva”. Um contingente de pessoas capazes de exercer uma determinada função produtiva que, de acordo com a lógica do Capitalismo, teriam que permanecer desempregados para que não se elevasse o preço da mão de obra. Uma manipulação da “Lei da Oferta e da Procura”, já descrita por Adam Smith. Na Europa da época, a referência produtiva era a indústria, hoje é mais variado.
Enquanto houver um farto e já nem tão industrial exército de reserva, o lado da oferta, o dos trabalhadores, será depreciado. De maneira que quando alguém diz “não se encontra gente pra trabalhar” isso pode significar três coisas:
- Não há pessoas.
- Há pessoas, mas que não têm qualificação técnica para aquele trabalho.
- Há pessoas, mas elas não aceitam trabalhar pelas condições que estão sendo oferecidas.
Em nosso caso brasileiro, com vasto contingente de desempregados, elimina-se imediatamente a primeira possibilidade. Já a segunda é real e trata-se de um drama que só tende a se agravar com a defasagem tecnológica entre os países economicamente desenvolvidos e os meros agroexportadores. O problema não é o agro, o problema não é a mineração, mas a incapacidade crônica que esses setores têm de gerar por si só avanços que nos elevem a um patamar em que não sejamos tão dependentes de exportar matéria prima.
O caso número três, entretanto, é o próprio enigma de nosso atraso. Limpar uma latrina em um País de capitalismo avançado – o que normalmente é feito por imigrantes – tem um valor muito maior que limpar uma latrina em um País do terceiro mundo, mas o processo é basicamente o mesmo. E sendo o processo semelhante, a causa da discrepância só pode ser o discrepante valor do tempo de vida, nesses lugares. É o humano, e não as suas competências, quem é precificado.
Se está sobrando gente capacitada para limpar uma latrina, então imagina-se que a pessoa deva contentar-se por limpar a latrina ao preço proposto pelo demandante. O trabalhador não quer chatear ninguém, talvez até faça o serviço, mas depois some. “Ele não quer trabalhar”, se diz. O que houve? - Uma reação subjetiva de indignação?
- Ou está em uma sociedade cujo desenvolvimento permite que o trabalhador tenha condições de sobreviver mesmo após declinar de uma proposta de serviço indigna?
Nesse caso, talvez só reste ao demandante limpar a própria latrina.