As manifestações sociais dos últimos dias me fizeram lembrar o movimento das Diretas Já. Minha mãe reuniu os filhos na sala e, em prantos, nos alertou: “Seu pai foi a Brasília e pode não voltar mais pra casa!”. Na época eu era um adolescente e achei que ele tinha ficado louco. Anos depois, quando votei pela primeira vez, vi que meu pai havia ido protestar por um Brasil melhor para mim e para todos os brasileiros.
Alguém disse que “o povo não deve temer seu governo. É o governo que deve temer seu povo”. Essa frase deve estar martelando a cabeça da presidenta Dilma, que declarou estar impressionada com a dimensão nacional do movimento. Os protestos, que começaram de forma pacífica, devido à ação violenta da polícia, transformaram-se em uma verdadeira guerra civil. Centenas de pessoas foram arrastadas para os camburões e presas sob a acusação de formação de quadrilha. No Brasil é assim: quando o povo se mostra desencantado com a política e se une para protestar de forma pacífica, está formando quadrilha.
Em meio a um cenário de caos, chamou atenção as frases escritas nos cartazes exibidos pelos manifestantes: “Desculpe o transtorno, estamos mudando o país”, “Lutaremos até o fim por um Brasil melhor” e “Professor, eu desejo a você o salário de um deputado e o prestígio de um jogador de futebol”. Além do grito de guerra dos participantes: “Da Copa eu abro mão. Quero dinheiro para saúde e educação”.
Tem protesto que durou pouco. No Maracanã, antes do jogo Itália x México, uma faixa foi estendida com a inscrição “Fair Play Governo”. Na véspera, em Brasília, o presidente da Fifa, Joseph Blatter, havia feito o mesmo pedido, mais fair play (expressão usada para exaltar o jogo limpo) aos torcedores que vaiavam a presidenta brasileira. Mas, como a Fifa não permite que torcedores promovam mensagens políticas ou ideológicas nos estádios, a faixa do Maracanã foi rapidamente retirada. Atitude democrática? O escritor inglês Aldous Huxley escreveu: “A ditadura perfeita terá as aparências da democracia, uma prisão sem muros na qual os prisioneiros não sonharão com a fuga. Um sistema de escravatura onde, graças ao consumo e ao divertimento, os escravos terão amor à sua escravidão”.
Graças aos gastos colossais do governo com a construção e reforma dos estádios (cerca de 33 bilhões de reais) e o reajuste das tarifas de ônibus, o povo acordou. E quando o povo acorda, o governo perde o sono.