É imperativo que o país aproveite o momento de crise política para a tomada de decisões que dizem respeito à raiz de problemas históricos. Uma dessas decisões é a proibição do financiamento empresarial de campanhas eleitorais. Tal financiamento é causa importante de corrupção.
O assunto tramita no Supremo Tribunal Federal com base na Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.650, proposta pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, mas há 10 meses a tramitação está sustada porque o ministro Gilmar Mendes “pediu vistas”. Essa protelação está cercada de dúvidas, já que seis dos onze ministros se declaram a favor da medida. Diz o ministro Mendes que “o assunto é do Congresso”, mas lá a proposta dificilmente passará, visto que o PMDB e boa parte dos partidos de direita já declararam contrariedade à proibição do financiamento empresarial.
O fim das doações empresariais aos partidos não visa separar a política da economia, pois isso é quimera. É reconhecido em todo mundo que política e economia sempre andaram juntas e assim continuará sendo, pelos simples fato de que a política (o Estado) não só regula os negócios privados, mas ao organizar os bens públicos acaba por fazê-lo de modo a satisfazer mais uns do que outros, e isso tem um valor monetário. As fronteiras entre o poder e o dinheiro nunca são muito nítidas, mas o que as doações empresariais das campanhas eleitorais fazem é contaminar amplamente as relações entre políticos e agentes econômicos, criando um ambiente propício para benefícios particulares.
Em alguns países desenvolvidos o quadro é semelhante ao brasileiro, como nos Estados Unidos. O sociólogo Amitai Etzioni escreve que a impressão de grande parte dos norte-americanos é que o lema “uma pessoa, um voto” foi substituído por “um dólar, um voto”. Lá, como aqui, o poder do dinheiro é visto como fator de desvirtuamento da boa política.
A proibição do financiamento empresarial de campanhas eleitorais é uma das principais propostas do projeto de Reforma Política formulado pela OAB, CNBB e organizações da sociedade civil. O projeto prevê que nenhuma empresa ou organização poderá destinar dinheiro a candidatos ou partidos. As pessoas físicas podem destinar até 700 reais. Os partidos terão suas atividades custeadas por esses recursos privados de filiados e simpatizantes e por um fundo público.
A proposta merece todo apoio, mas ela só tem viabilidade com forte pressão popular. A medida não é mágica, nem suficiente por si própria para impedir a corrupção. Um ponto frágil que vem sendo apontado é que a proibição pode ser burlada através do conhecido “caixa dois”, o dinheiro não declarado, de modo a criar uma situação em que os partidos receberiam mais recursos públicos sem deixar de receber recursos empresariais. A solução para isso é: fiscalização ativa e permanente dos órgãos responsáveis, criminalização do “caixa dois”, estabelecimento de limites de gastos das campanhas e de limites para o recebimento de recursos pelos partidos.
Contra a medida, há fortes interesses instalados. O apoio dos que protestam contra a corrupção é fundamental.