A popularização de assuntos como a coleta seletiva e a reciclagem está aumentando, cada vez mais, na Internet e na casa dos brasileiros, principalmente entre os mais jovens que, com acesso ás informações, têm se conscientizado sobre a importância dos temas. Apesar do crescente interesse, no Brasil, 41,6% das 78,3 milhões de toneladas de resíduos gerados anualmente ainda têm destinação inadequada, segundo levantamento da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe). De acordo com uma outra pesquisa, do Banco Mundial, caso não ocorra uma mudança nos atuais padrões, a quantidade de lixo despejada no mundo crescerá 70% até 2050.
Para que a mudança ocorra, a conscientização da população para o tema é essencial — um estudo feito pelo Ibope por encomenda da cervejaria Ambev releva que 75% das pessoas dizem não separar os materiais recicláveis em casa — porém, não há qualquer incentivo econômico para que ocorra esta mudança. Redigido desde 2012, o Plano Nacional de Resíduos Sólidos apresenta os Incentivos Econômicos como uma ferramenta fundamental para financiar os serviços de limpeza pública, orientar o comportamento da população e, assim, responsabilizar os impactos gerados pela quantidade de resíduos produzidos trazendo, na prática, o conceito do “poluidor pagador”. Neste sentido, o plano possui exemplos de incentivos econômicos adotados em outros países e que podem servir como guia para a realidade brasileira. Dentre eles, um dos principais sistemas de cobrança amplamente usada na União Europeia, conhecida como “Pay-As-You-Throw” (PAYT), traduzido para Responsabilidade Proporcional ao Descarte (RPD).
Quando existe, o sistema municipal de cobranças pela coleta de lixo, com taxas fixas ou valores embutidos no Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU), é deficitário financeiramente e não conta com os incentivos necessários para que a população se engaje em reduzir a geração e realizar o descarte adequado — o que só contribui para o aumento da produção de lixo e para a baixa taxa de reciclagem. Como solução, as prefeituras precisariam tomar a decisão de criar decretos municipais, com o apoio do poder legislativo, para instituir a precificação unitária, conforme previsto na Política Nacional de Saneamento (11.445/2007).
Assim como funciona com energia ou o abastecimento de água, um sistema com um valor unitário para resíduos sólidos faz com que se pague de acordo com a quantidade de lixo gerada por cada imóvel. Isso estimularia a redução do total de resíduos e faria com que as pessoas separassem os materiais recicláveis para economizar. É um sistema mais igualitário onde aqueles que mais demandam do sistema de limpeza pública passem a pagar mais. Conhecido mundialmente, o sistema PAYT já é uma realidade há quase três décadas em mais de dez países das Américas, Ásia e Europa e começa a ser discutido no Brasil.
A precificação unitária proporciona uma arrecadação específica capaz de cobrir a totalidade dos custos municipais de coleta, destinação e tratamento dos resíduos. Por um lado, faz com que a gestão de resíduos não dependa do tesouro municipal, que poderá dedicar sua arrecadação como IPTU, ISS e repasses para segurança educação e saúde, por outro, acaba a inadimplência com as empresas de coleta e destinação de resíduos, estimada em mais de 10 bilhões de reais segundo a Associação Brasileira de Limpeza Pública (ABLP).
Um formato adequado para implantação do sistema RPD no Brasil é o de sacos oficiais de lixo, com logotipo da prefeitura, que seriam vendidos nas lojas do varejo. O valor dos serviços de coleta, tratamento e destinação dos resíduos estaria embutido no preço de venda desses sacos de lixo. E apenas eles seriam recolhidos pelas empresas responsáveis pela coleta, num sistema simples e eficaz. Falta apenas que um prefeito implante e sirva de exemplo para os outros.
A grande questão é que, o formato atual de cobrança é injusto com o contribuinte, pois hoje ele paga pela coleta de um vizinho que gera mais lixo ou mesmo do comércio ou restaurante que são atendidos pela coleta domiciliar. Ou seja, além de não pagar por uma taxa de acordo com o que descarta, deixa de criar hábitos sustentáveis como a separação de material reciclável por falta de incentivos. O retrato mais nítido é quando temos um imóvel vazio, que não consome nem paga conta de água e luz, mas paga uma taxa de resíduos mesmo sem gerar nada.
Com o RPD, se reduz a geração de rejeitos — reduzindo o gasto público com coleta de destinação, aumentariam a separação de materiais recicláveis — beneficiando diretamente as cooperativas de reciclagem, reduziria o impacto ambiental, tanto por reduzir a extração de matéria prima, como por dispor menos resíduos no meio ambiente e evitar emissões de CO2. Infelizmente, ainda precisamos de coragem por parte do poder público para a implementação de uma tarifação mais justa.
*Rodrigo Oliveira é presidente da FRAL Consultoria, especializada em projetos de engenharia civil, meio ambiente e sustentabilidade.