O Brasil chega à marca de mais de 470 mil mortes por Covid-19 e, aos poucos, as mobilizações de ruas voltam a ser convocadas, estampando as notícias dos canais de TV e trazendo à tona o debate sobre a pandemia e o governo Bolsonaro. Enquanto a CPI no Senado Federal convoca ex-integrantes do governo federal e do gabinete paralelo, uma pergunta segue no ar: como um governo de recorrentes crises, conflitos e rupturas segue rumo ao caos sem barreiras ou adversários? Mesmo com o STF, com a Constituição ou a sombra de Lula, Bolsonaro segue sendo o principal ator do cenário político.
Parece fácil entender o bolsonarismo, mas o que vemos é um complexo movimento de extrema-direita. Por conta de sua política, suas declarações e trejeitos, muitos analistas colocam Bolsonaro como um sujeito de natureza simples, diminuindo sua capacidade política e o colocando como um equívoco do destino eleitoral. Neste ponto, não há mais como caracterizá-lo como um mero acidente de percurso. A grande presença de militares tanto nos postos-chave da estrutura federal, quanto ao seu redor mostra que há consenso no projeto político social e econômico capitaneado pelo ex-deputado.
Mais do que consenso por Bolsonaro, é legítimo dizer que ele é produto das Forças Armadas. Quando mexeu no alto comando da instituição, em um movimento arriscado, não houve qualquer interferência. Atualmente, mais de 7 mil militares estão presentes no governo federal. Ao contrário do que se supôs de que Bolsonaro seria um mero fantoche, ele dá as cartas e aposta alto.
Por trás de todos os escândalos, falas polêmicas e posicionamentos de governo, há uma clara estratégia de pautar os seus adversários, colocando-os como do outro lado da ponta. Vejamos o exemplo da pandemia. Enquanto todos ressaltavam a importância de evitar sair de casa, o presidente foi o primeiro a falar em nome daqueles que não têm chance de decidir não ir trabalhar. Defendeu o tratamento precoce, não usou máscara, aglomerou, minimizou a pandemia e saiu às ruas para encontrar o povo. Ao fazer seus movimentos, Bolsonaro indiretamente faz com que cada adversário seu tenha que se posicionar e isso o agrada. O seu jogo de antagonismo não estaria completo sem a resposta de quem ele busca rivalizar.
Desta forma, o País vai sendo levado ao penhasco por uma estratégia macabra, mas que encontrou respaldo em uma parcela da população. A impunidade e a anistia pelos 21 anos de ditadura militar, a falta de reparação histórica, levou as Forças Armadas a construírem novamente a nossa “democracia” com as suas mãos e ameaças de golpe.
Não se enganem, não há nenhum percalço ou acidente: Bolsonaro é fruto do Partido Militar Brasileiro que a cada dia busca se enraizar ainda mais na estrutura do poder. A pergunta que fica é: seremos capazes de derrotar mais este projeto? Nas urnas, nas ruas, quando? Eu espero que seja antes de chegarmos a mais de meio milhão de mortos por Covid-19 no Brasil.