Em outro momento refleti neste espaço sobre a vitória de Trump no Estados Unidos, isto há mais de quatro anos. Naquele momento falei sobre a incredulidade de acreditar como foi possível Trump derrotar o legado de Obama, em especial, pela total ausência de pudor do então chefe de estado sobre questões que pareciam até então resolvidas na América, como imigração, racismo, religião, homofobia e outros. O governo Trump destilou ódio para o mundo, e pior, criou seguidores como é o caso do Brasil.
Agora com a vitória de Biden, ao que se tem visto e ouvido, há a intenção evidente de uma guinada em vários aspectos, tanto internos como externos da política dos EUA. Internamente, Biden dá claros indicativos de que pretende formar um governo plural, onde as várias facetas da complexa sociedade norte-americana estejam representadas, e na política externa, já constam sinais evidentes que o seu governo pretende recompor seu importante papel no multilateralismo, como nação mais poderosa do mundo, voltando a participar de organizações internacionais como OMS e ONU, que foram desprezadas por Trump.
Mas o significado que quero ressaltar na eleição de Biden serve para o Brasil e todas as nações democráticas do planeta. Creio que a vitória dos democratas nos EUA simboliza que o chefe de Estado não pode se comportar como um chefe de torcida, seja dos crentes, dos homofóbicos, dos nacionalistas, dos anarquistas, dos ateus, ou de quem quer que seja. O contrato social, pensado pelos contratualistas dos séculos XVII e XVIII (Hobbes, Locke e Rousseau), já tratou destes temas, aliás, o mundo ocidental deixou raízes sobre os conceitos destes filósofos.
Compreendendo isto, o papel do Estado, representado pelo líder eleito democraticamente, deve ser de mediador das forças poliédricas que compõem o conjunto da sociedade, e não de um militante cego de parcela desta que temporariamente o levou ao poder.
Conceitos como Estado laico, liberdade de crença, distribuição de renda, justiça social, livre iniciativa e lucro não são conceitos antagônicos como muitas vezes se tenta fazer crer. Quem já teve acesso ao texto Constitucional do nosso País, sabe que tais conceitos estão muito bem definidos na Lei Maior, não havendo qualquer contradição. Mas é dever do chefe da Nação saber que suas convicções pessoais, devem ser freadas pela Lei Maior, sob pena do voto gestar os pequenos ditadores do século XXI, que felizmente têm tido governos breves.