Sabemos bem que a sociedade moderna é por estrutura barulhenta. Vivemos em parte com muito barulho e muita gente em permanente barulho. Os diversos e crescentes sons externos nos adoecem sempre mais, mesmo que não nos damos conta dessas disfunções. Muitas nações que têm aplicado leis rígidas em grandes centros urbanos no controle dos diversos e tantas vezes desnecessários ruídos. Entretanto há um barulho que é muito delicado: O barulho interno. A criança recém-nascida tem nos seus primeiros meses longas horas de sono, que na verdade significa silêncio. Entramos na roda da vida como amantes do silêncio. Feliz a criança que tem pais que também amam o silêncio. Ela crescerá mais centrada e com maior capacidade de contentamento segundo a psicologia infantil moderna.
Somos, enquanto seres humanos portadores de três dimensões que formam uma única unidade: corpo, mente e espírito. Manter o equilíbrio no sentido de cuidar com o devido tempo e meios, de cada uma delas, constitui hoje um desafio no mundo moderno. O descuido dessa unidade tem custado muito caro ao Estado e ao bolso de muita gente que adoece, ou que demora na recuperação de disfunções adquiridas pelo meio e pela forma em que vivem. Nosso barulho interno geralmente tem cinco perigosas fontes: “ruminação”, insônia, raiva, estresse e frustração.
Sabemos especialmente pelos animais bovinos o processo de ruminação como e quando se dá. Em saúde emocional podemos entrar num difícil processo “ruminante” e que nos rouba muita energia. Próximos a nós, com certeza, têm pessoas que “ruminam” o tempo todo. Elas se tornam reféns de pensamentos que pululam todo o tempo em suas mentes. Quando contínuo e em alto grau, o processo ruminante poderá adoecer a pessoa. São comuns frases como: “esse episódio não sai de minha cabeça”. “Continuo encucado com essa situação”, “meus miolos estão fritando”, etc. Outro barulho vem da insônia. Muitos insones fazem uma “discussão” interior conversando com seus muitos e confusos pensamentos noite adentro. É uma hora difícil para a maioria das pessoas portadoras da disfunção do sono. Elas acumulam um cansaço físico e mental enorme. A maioria queixa mais do cansaço mental pelo desgaste da mente estar “ligada” todo o tempo. Em minha experiência em psicoterapia clínica tenho observado que o desgaste interno advindo da raiva é o mais prejudicial para uma boa saúde psicoemocional. O barulho interno gerado pela raiva é turbulento e agressivo para a própria pessoa, pois permite que seu organismo produza uma ação tipo super descarga de toxinas no sangue, ou mesmo produzindo uma patologia diagnosticada há apenas dez anos: fadiga adrenal.
A exaustão emocional causada pelo barulho interior pode ter muitas formas. A que é gerada pelo estresse é a que mais faz estragos nas duas últimas décadas, apesar de muita informação confiável quanto a uma vida desestresssada. Pessoas que são portadoras de alto grau de estresse estão sempre de “cabeça quente” ou como se diz: “pavio curto”. Elas entram em constantes “choques” por nada. Parece o tal do “fio desencapado” e atualmente aumenta o número dessas pessoas nas empresas e em muitos ambientes conforme o formato familiar. Daí vem o perigoso e crescente fenômeno da chamada intolerância.
O moderno barulho interior, sempre mais crescente, tem na fonte da frustração um amplo público que não sabe lidar com perdas menores ou maiores. Hoje tantos não sabem lidar com qualquer espécie de perda e esquecem que na vida não há perdas, mas apenas lições. Gerar internamente um mega barulho de muitas perguntas sem respostas por uma situação de frustração nos adoece rapidamente. Por isso a importância da preparação emocional para encarar de forma lúcida as perdas e saber que não vamos acertar ou vencer em tudo. Assumir a condição de que também somos limitados e até vulneráveis em muitas situações existenciais nos deixam mais tranquilos e mais saudáveis.
Substituir o nosso barulho interno por uma calma interior é algo terapêutico e também uma arte no sentido de aprendermos a adquirir uma condição mais pacificada, mais centrada e melhor focada em nós mesmos, não como um hedonismo, mas como uma evolução humana, alcançando um degrau a mais na nossa saúde emocional, biofísica e espiritual. O silêncio sempre é um amigo que nos cura. Tenho amigos aliados do silêncio e tenho por eles um olhar diferente, pois eles passam uma paz e serenidade no ser e fazer. A calma ou silêncio interior podem ser adquiridas através de um esforço não necessariamente estoico, apenas como o jovem candidato a uma prática esportiva, que requer dele cada dia disciplina e foco no que vai fazer.
Quando as pessoas alimentam seus sonhos, assumem projetos legais, ou casam de forma adulta e feliz, iniciam uma faculdade, entram num novo e bom emprego, ou se tornam pais com o nascimento do primeiro filho, constroem uma bela casa, etc, despertam nelas um diálogo interior pacífico e voltado a uma escuta atenta de si mesmas. O barulho interno é substituído por um silêncio saudável e fecundante, onde seus projetos trazem vibração, alegria e vida nova. Por fim, nosso eu interno alimenta-se de arte, espiritualidade, poesia, literatura, lazer saudável e especialmente de boas e saudáveis amizades. Um interior ausente do barulho torna-se um espaço iluminado e iluminador. Aqui vale muito o pedido de Jesus que sabia muito como sentir o interior das pessoas. Ele pediu carinhosamente: “Cuida bem da luz que habita em ti!” – Lucas 11,35.
Cyzo Assis Lima.fpm
Padre e psicoterapeuta clínico – www.vivares.info