Os que acreditam em democracia e torcem pelo seu êxito nos diversos continentes têm um motivo a mais para comemoração neste final de ano. O anúncio do reatamento das relações entre Estados Unidos e Cuba é um alento neste nosso mundo repleto de conflitos.
Por ora, não há motivos para otimismo excessivo com relação à reaproximação. O embargo econômico a Cuba não pode ser derrubado por ato administrativo do governo Obama: depende de maioria no Congresso, no qual os republicanos, adversários da aproximação, são majoritários. Mas, as reações favoráveis, interna e externamente, indicam o apoio ao reatamento das relações, rompidas em 1961 no contexto da Guerra Fria.
O fim das hostilidades entre Estados Unidos e Cuba tem um significado histórico: é uma espécie de “queda do muro de Berlim” na América Latina. Representa o fim de uma visão obscurantista difundida especialmente pelo lado mais forte, o norte-americano, acerca da suposta ameaça comunista que os cubanos continuariam a representar.
No Brasil, como se viu ao longo da campanha presidencial, setores da extrema direita conseguiram muitos adeptos para a teoria estapafúrdia de que o governo Dilma mantinha relações suspeitas com o regime cubano por razões ideológicas, representando uma ameaça comunista para o país. Os investimentos do governo brasileiro no porto cubano de Mariel, através do BNDES, seriam a principal “prova do crime”.
A nossa mídia graúda fez eco a essa versão primitiva. O “bolivarianismo” seria a versão comunista dos dias atuais: além de Cuba, a estratégia esquerdista contaria com o protagonismo dos governos da Venezuela e da Bolívia. A vinda dos médicos cubanos ao Brasil esteve cercada por esse ambiente de suspeição e hostilidade. Tal visão tende agora a se tornar alvo de chacota. Afinal, alguém tem coragem de considerar o governo Obama um simpatizante do regime cubano ou uma extensão bolivarianista?
A decisão de Obama põe uma pá de cal na fantasia anti-comunista. E mostra que a linha política e econômica do governo Dilma é correta em relação a Cuba. Desde Lula, a política externa do país vem sendo guiada pelo princípio da ampliação das relações com países dos diversos continentes, desvencilhando-se da extrema dependência em relação aos Estados Unidos e à União Europeia. Comportando-se como a maior potência da América do Sul, disposta a assumir papel de liderança junto aos vizinhos, o Brasil vem mantendo sua autonomia em relação à influência norte-americana. Os resultados econômicos e políticos mostram o acerto dessa linha de atuação.
Os investimentos no Porto de Mariel são um “golaço”, conforme a reportagem do jornal Folha de São Paulo. Trarão mais retorno econômico ao país no curto prazo do que se previa, pois Mariel é o entreposto mais próximo do imenso mercado norte-americano, de grande importância para o Brasil e para todos os países latino-americanos. Não se trata de ideologia. São negócios. Negócios bons para os vários lados. Quem fantasiou que isso era comunismo já sabe: é hora de reciclar os conceitos.