A palavra reprovação escolar está vinculada à ideia de condenação, incapacidade e insucesso. Trata-se de uma questão que aflige todos os envolvidos no processo: os estudantes, os pais e os educadores, além de trazer no seu bojo um conjunto de mitos que necessitam ser esclarecidos, principalmente aos pais.
Acredito que a reprovação não deveria existir no ensino fundamental, pois, tratando-se de escolaridade obrigatória, é esperado que seja oferecida para que todos obtenham sucesso – compreendido na maior pluralidade possível – no percurso escolar que lhes é imposto por força da lei. Melhor dizendo, os meninos e meninas não escolheram estudar, mas são obrigados a frequentar a escola porque a sociedade brasileira assim decidiu, com o que concordo.
Ora, se a sociedade decidiu pela escolaridade obrigatória entre os seis e os 14 anos de idade, então que se mobilize para que ela seja eficaz para todos. Isso porque todos são capazes de aprender, desde que sejam respeitados seus sentidos, ritmos, cultura e condições cognitivas.
Partindo desse pressuposto, podemos nos perguntar: por que, então, existe a reprovação? Explico: a reprovação existe porque não sabemos fazer uma escola que trabalhe com as diferenças. Nosso olhar “educador-míope” concebe um aluno-padrão e elabora práticas pedagógicas com base nele. Assim, quem não se enquadra no padrão – não por ser pior, mas por ser diferente – acaba sendo reprovado.
Outra hipocrisia da pedagogia da reprovação localiza-se no fato de reprovar apenas o aluno, desconsiderando questões fundamentais do complexo processo escolar. O aluno, aquele que deveria ser resguardado, acaba sendo o culpado pelo seu próprio não saber. Ora, mas a escola não existe para ensinar? O aluno não vai à escola para aprender? Caso ele não aprenda, quem deve ser reprovado: ele ou a escola?
Contudo, apesar do exposto, se você ainda viver um momento de reprovação escolar, pode tirar dele um pequeno potencial pedagógico. É preciso reconstruir o termo, já que reprovar é um verbo cujo significado pode ser “provar de novo”, como o refazer significa, também, “fazer de novo”.
Confesso que não acredito muito nisso, mas, para acalentar pais angustiados, talvez eles possam dizer aos filhos que, se tivermos que provar um saber num determinado momento e não conseguirmos, resta-nos uma segunda chance. Então poderemos provar de novo aquilo que sabemos, só que em outro tempo.
É importante sabermos ensaiar o discurso para dizer a nossos filhos que reprovar pode ser um novo momento de provar e que, para isso, é preciso revisitar alguns saberes. Seria jogo de palavras? Penso que sim, mas vale tudo para recuperar a esperança e a autoestima de quem é o sujeito do existir escolar.
*Pedagoga, Mestre em Educação, diretora Pedagógica do Agora Sistema de Ensino (www.souagora.com.br)