Lucca Herzog
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Com o sucesso do primeiro Festival de Jazz e Blues, Santa Cruz demonstrou a força de sua diversidade cultural. Reunindo um grande público em três noites de muita música, superou as expectativas dos que acolheram o festival como uma grande novidade, que já esperam a edição de 2024.
Integrando diversos gêneros e estilos musicais, o evento apresentou tanto atrações locais quanto músicos internacionais. Entre eles, o trompetista italiano Sean Lucariello (@sean_lucariello), que se apresentou junto da banda santa-cruzense Privilege Jazz, na terceira noite do Festival. Lucariello esteve na sede do Riovale Jornal, e compartilhou suas impressões do evento e da cidade, bem como a sua visão do potencial da música na região.
Entrevista: Sean Lucariello
Primeiramente, o que achou da cidade?
A cidade é muito diferente do que eu imaginava. As suas características provavelmente têm muito a ver com a influência alemã. É muito mais europeia, do ponto de vista da apresentação estética, do que muitos europeus esperam, por causa dos estereótipos a respeito do Brasil.
E o Festival?
Foi a primeira edição, e tinha muita gente. Isso foi algo que me chocou. Muita energia, reações genuínas, que duraram o evento inteiro. Parecia que o pessoal estava gostando bastante. Senti uma certa necessidade de fazer um evento do tipo na cidade, e foi muito bom ver a participação do público, que estava muito engajado. A grande diferença que vejo entre o público italiano e o brasileiro, ao menos do que vi, é que aqui é muito mais participativo. Na Itália, é um pouco destacado do evento. Desejo que o Festival daqui cresça ainda mais. Não só os músicos merecem isso, mas a cidade.
Quais as tuas perspectivas da nossa cena musical?
A linguagem do jazz, hoje, tem muitas diferenciações. No norte da Europa, vai ter um som muito diferente do mediterrâneo, por exemplo. Imagine no outro lado do mundo, como o Brasil. Por isso, é muito interessante e enriquecedor tocar em outros lugares do mundo, porque se observa pessoas tocando o mesmo tipo de música, mas sempre com uma interpretação diferente. Eu fiquei muito surpreso com a curiosidade dos músicos brasileiros. É algo que não os limita a buscar só um gênero. Nota-se muito a influência da música tradicional brasileira em qualquer coisa que eles fazem, com raízes no samba e em outros gêneros nacionais. Tenho uma admiração muito grande por essa música, não só pelo ponto de vista estético, pela beleza poética, mas pela grande complexidade. E fico sempre feliz em ver músicos que apreciem e explorem isso. Eu falo com um pouquinho de inveja, porque o Brasil é um país de muita mistura de culturas e raízes diferentes. Em Santa Cruz, por exemplo, tem uma mistura de brasilidade com raízes alemãs, e isso é muito admirável.
Como a estadia na cidade te afetou como músico?
Primeiro, tenho uma vontade muito forte de fazer uma turnê com meu quinteto aqui no Brasil. Além de concertos, minha intenção é propor aulas de jazz, para dar chance das pessoas que são interessadas de ter mais contato com músicos profissionais. Levo também a consciência de que a música ao vivo não é um projeto social, mas um evento social no sentido de que depende da participação do público. O que acontece muito frequentemente, em artistas mais experientes, é que se esquecem dessa dinâmica e acabam produzindo uma música que é muito hermética, fechada em si mesma. Outra coisa que aprendi, principalmente com o Diego, do Privilege Jazz, foi a importância do relacionamento com o público não só no palco, mas fora dele. Isso também é parte do trabalho.
Por fim, quais os caminhos para fomentar ainda mais o jazz em Santa Cruz?
Primeiramente, um festival anual já vai fomentar esse interesse, seja no público ou nos músicos, que são quem cria a cena, no fim das contas; abrir espaços para jam sessions (improvisações) ao vivo, com oportunidade para as pessoas ouvirem e tocarem essa música. Outra coisa é criar a possibilidade de chamar pessoas de outras cidades, como Porto Alegre, que tem uma cena de jazz forte, para trazer seminários e cursos para os músicos daqui. Também incentivar os músicos locais a se aproximarem dessa linguagem do jazz, porque a base do jazz pode ser aplicada em qualquer gênero musical. Conhecer o máximo possível de música ajuda a se tornar um músico melhor.