Ana Souza – [email protected]
A Brigada Militar registrou mais um caso de violência contra a mulher. No dia 20 de dezembro a guarnição da BM de Venâncio Aires libertou uma mulher, de 52 anos, que estava 35 anos presa à uma vida de violência doméstica. O fato ocorreu em Linha Arroio do Tigre, interior de Santa Cruz do Sul, no limite com o município de Venâncio Aires. O suspeito do ocorrido era esposo da vítima. O autor de 57 anos não tinha antecedentes.
Conforme a capitã da BM, Michele da Silva Vargas, a mulher sofria, há mais de 30 anos, ameaças e agressões por parte do marido durante todo o período do casamento. “Por diversas vezes ela disse que o marido iria matá-la envenenada ou esfaqueada. Também era forçada a realizar trabalhos pesados na lavoura para o companheiro e para vizinhos, a fim de compensar acordos. O cônjuge não a deixava sair de casa, poucas vezes saiu, mas somente com sua autorização. Passou por situações de ser obrigada a fazer relações sexuais. No último final de semana recebeu a visita de seu único filho, o qual quando completou a maioridade foi obrigado pelo pai a sair de casa, momento que relatou que não aguentava mais e que iria novamente tentar suicídio”, relatou a capitã.
Segundo relatos à BM, para que ela pudesse arrumar os dentes, teve que percorrer 2h30min a pé para ir e o mesmo tempo para voltar, pois ele se negava a levá-la de moto. Moto essa comprada com a herança dela da venda de uma vaca, a qual obrigou a dar-lhe o dinheiro. E se ela quisesse carona teria que pagar R$ 10,00. Contudo, nunca lhe deu um real. Ele cortava os cabelos dela para que não fosse no salão e falasse com alguém. Nunca comprou uma roupa, obrigada a trabalhar para os outros e para ele, além de carregar sozinha fardos de fumo e lenha.
Um desfecho final do caso ocorreu no dia 20, quando o filho da vítima foi até o quartel da BM, em Venâncio Aires, orientado por um parente. Foi o momento definitivo para que a vítima pudesse decidir por uma nova vida. “Este parente havia participado de uma roda de conversas da Patrulha Maria da Penha e, sabendo onde buscar ajuda, solicitou que o filho da vítima procurasse a BM. Tomamos par do assunto e duas guarnições se deslocaram até a residência no interior para buscar a vítima, a qual passará a residir com o filho único e que, após ser expulso de casa aos 18 anos, foi acolhido por familiares e trabalhou para conseguir retirar sua mãe do sofrimento. Também foi solicitado a representação criminal, bem como as medidas protetivas à vítima.” A ocorrência foi registrada em Santa Cruz do Sul em razão da circunscrição territorial e será acompanhada pela Delegacia Especializada de Atendimento a Mulher (Deam) em Santa Cruz do Sul. O inquérito está sendo apurado pela delegada Raquel Schneider.
“É difícil acreditar que ainda nos dias de hoje possamos ter mulheres nessas condições de vida. Não acreditamos que situações como esta ainda existam no mundo atual, mas, infelizmente, sabemos que há muitas, mais ainda nas zonas rurais, onde são agredidas e isoladas. A sociedade precisa se envolver e denunciar, não aceitar essa vida a seu próximo. Qualquer denúncia que chegar até a Brigada Militar estaremos sempre a postos para averiguar e levar a justiça para quem descumpre a lei. A vítima foi amparada e vai viver com o filho, que hoje tem 34 anos, e receber o amor e uma vida digna que não teve por muitos anos”, frisou a capitã Michele.
Apoio às vítimas de violência através da Patrulha Maria da Penha
A principal política de proteção à mulher vítima de violência de gênero, da Patrulha Maria da Penha (PMP), programa da Brigada Militar, com atuação em todo o Rio Grande do Sul, existe desde 2014 em Santa Cruz do Sul. Foi instituída pela BM em 2012 e completou este ano 10 anos de atuação. No Município, diversas mulheres são atendidas pela PMP, composta por policiais militares das 1ª e 2ª Companhias da Brigada Militar de Santa Cruz do Sul (23°BPM), sob coordenação do capitão Rafael Carvalho Menezes.
“A Patrulha como principal objetivo as Medidas Protetivas de Urgência (MPUs), expedidas pelo poder judiciário. A vítima irá ligar para o 190 ou fazer o registro diretamente na Polícia Civil, informando que está sendo vítima de violência doméstica e solicitar a MPU, após deferida pelo juiz, a vítima é colocada junto à Rede de Proteção, que engloba o Conselho da Mulher, o Escritório de Defesa da Mulher, o Estado e o Município para se forma um grande apoio para as vítimas de violência. De posse desta medida protetiva realizamos as visitas para as vítimas. Em dias específicas os patrulheiros, homens e mulheres com curso de capacitação, vão até a residência destas e fazem os questionamentos. O trabalho visa contribuir com as ações de proteção das mulheres vítimas de violência doméstica e/ou familiar, de forma preventiva e ostensiva. Atualmente são 417 mulheres que fazem parte da rede de proteção. Desde 214 não tivemos nenhuma vítima de feminicídio. Foram registrado casos em Santa Cruz mas, infelizmente, não conseguimos colocá-las em tempo na rede de proteção.
O caso de Venâncio Aires choca a comunidade, frisou o capitão. “Mas acende um alerta para que possamos dar uma olhada, principalmente no meio rural, para que nas residências vizinhas verifiquem se não há notícias de que nenhuma mãe, esposa, mulher, esteja em situação de violência doméstica, quase similar à uma escravidão”, frisou.
Símbolo de luta pela vida sem violência
Maria da Penha por anos foi vítima de violência doméstica e, devido à sua busca por justiça, que levou mais de 19 anos, se tornou símbolo de luta pela vida sem violência. Em 1983, Maria da Penha sofreu duas tentativas de feminicídio de seu então marido, que a deixou paraplégica, com um tiro nas costas, mesmo após duas cirurgias. O ex-marido ainda a manteve 15 dias em cárcere privado e tentou eletrocutá-la enquanto tomava banho. Em agosto de 2006 foi sancionada a Lei nº 11.340/2006 em vigor até hoje, conhecida como Lei Maria da Penha. (Com informações SSP/RS)