Etiene Faccin
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No dia 7 de agosto de 2006 foi sancionada, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a Lei Maria da Penha. Com 46 artigos, ela cria mecanismos para prevenir e coibir a violência doméstica e familiar, além de estabelecer medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência.
Desde a sua publicação, a lei é considerada pela Organização das Nações Unidas (ONU) como uma das três mais avançadas legislações do mundo no enfrentamento à violência contra a mulher. Em razão dos 15 anos da lei, neste mês comemoramos o Agosto Lilás.
Iara Bonfante, presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher (CMDM), relata que “a Lei Maria da Penha é um marco para as mulheres, pois antes desta lei o crime de violência contra a mulher era tido como um crime de menor potencial ofensivo. Agora, com a lei, ele é tipificado. Antes, os homens pagavam cestas básicas ou realizavam trabalho voluntário para se livrarem de uma condenação, agora não é mais assim”.
É importante ressaltar que o Brasil ocupa o 5º lugar no mapa mundial da violência contra a mulher e, de acordo com dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública de 2020, uma mulher é assassinada a cada duas horas no Brasil.
“A violência contra as mulheres causa enorme sofrimento, deixa marcas nas famílias, afetando várias gerações, e empobrece as comunidades. Impede que as mulheres realizem suas potencialidades, limita o crescimento econômico e compromete o desenvolvimento. No que se refere à violência contra as mulheres, não há sociedades civilizadas”, destaca Koffi Annam, ex-secretário da ONU.
A LEI
A Lei Maria da Penha nasceu em decorrência da luta judicial traçada, durante longos 19 anos e seis meses, por uma mulher brasileira que ficou paraplégica após uma tentativa de feminicídio tramada pelo próprio marido em 1983.
Conforme informações do Instituto Maria da Penha, após dois julgamentos em que o réu foi sentenciado à prisão e, através de recursos saiu em liberdade, em 1998 o caso ganhou uma dimensão internacional. Maria da Penha, o Centro para a Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) e o Comitê Latino-americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (Cladem) denunciaram o caso para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (CIDH/OEA).
Mesmo diante de um litígio internacional, o qual trazia uma questão grave de violação dos direitos humanos, o Estado brasileiro se manteve omisso e não se pronunciou em nenhum momento durante o processo. Em 2001, a CIDH/OEA responsabilizou o Brasil por negligência, tolerância e omissão em relação à violência doméstica praticada contra as mulheres brasileiras.
Em 2002 foi formado um Consórcio de ONGs feministas para a elaboração de uma lei de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. Após muitos debates com o Legislativo, o Executivo e a sociedade, o projeto de lei foi aprovado por unanimidade.
SANTA CRUZ DO SUL
Em Santa Cruz do Sul, a rede de proteção às mulheres vítimas de violência conta com o Escritório de Defesa dos Direitos da Mulher (EDDM); o Conselho Municipal dos Direitos da Mulher (CMDM); a Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (DEAM); a Casa Abrigo; a Patrulha Maria da Penha (PMP); a Sala das Margaridas, localizada na Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento (DPPA), e a Guarda Municipal.
O Estado do Rio Grande do Sul, formado por 497 municípios, possui apenas 14 casas abrigos. Em Santa Cruz, a casa abrigo existe há nove anos.
Segundo informações do CMDM, de janeiro deste ano até agora, 10 agressores foram presos por descumprirem as medidas protetivas. “Isso é uma coisa que normalmente não acontecia, geralmente eram um ou dois casos de descumprimento. E esse é um dado bem preocupante”, sublinha Bonfante.
Janaina Freitas de Oliveira, coordenadora do Escritório Municipal de Defesa dos Direitos da Mulher, informa que o objetivo do escritório é “fazer a escuta sigilosa e respeitosa, dar apoio e orientação à mulher vítima de violência e também articular os serviços existentes na rede de proteção”.
Em nosso Município, cerca de 90% das mulheres que buscam a delegacia para realizar um boletim de ocorrência por violência doméstica solicitam a medida protetiva. Mensalmente são registradas por volta de 100 a 120 denúncias, reflexo da rede de apoio e proteção que encoraja as mulheres a romperem com o ciclo de violência.
Conforme Janaina, desde o início do ano foram acolhidas 13 mulheres e seus filhos na Casa de Passagem, elas podem permanecer até 180 dias no espaço onde recebem apoio jurídico, psicológico e proteção. A localização da casa é sigilosa, priorizando a segurança e bem-estar da vítima.
COMO DENUNCIAR
As denúncias podem ser realizadas através do Disque Denúncia, no número 180, ou por meio dos seguintes canais:
- Delegacia da Mulher, na Av. Euclydes Kliemann, 1.515. Telefone: (51) 3713-4340
- Escritório de Defesa dos Direitos da Mullher, na Av. Euclydes Kliemann, 1.515. Telefone: (51) 3715-9305
- Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento, na Rua Enresto Alves, 915. Telefone: (51) 3711-2121
Sobrevivi… Posso contar
O livro Sobrevivi… Posso contar, da editora Armazém da Cultura, narra a história de luta e busca por justiça da brasileira Maria da Penha. Ela oferece sua história como uma forma de contribuir com transformações urgentes, pelos direitos das mulheres a uma vida sem violência. O livro é intenso, embrulha o estômago e é impossível se livrar do imenso desejo de entrar no relato e salvar aquela mulher. “Acordei de repente com um forte estampido dentro do quarto. Abri os olhos. Não vi ninguém. Tentei mexer-me, mas não consegui. Imediatamente fechei os olhos e um só pensamento me ocorreu: ‘Meu Deus, o Marco me matou com um tiro’. Um gosto estranho de metal se fez sentir, forte, na minha boca, enquanto um borbulhamento nas minhas costas me deixou ainda mais assustada. Isso me fez permanecer com os olhos fechados, fingindo-me de morta, pois temia que o Marco me desse um segundo tiro”. Trecho retirado do livro.