Eles percebem a eternidade por não ‘agorar’ nenhum futuro, nem ‘razoar’ tanta fundura pelos tapumes do ‘depois’.
É possível olhar para o passado? Sim, isso até podemos, mas não necessariamente voltando os olhos para trás. Olhamos para os “ontens” ao abrirmos os olhos para dentro, ali, quando iluminamos o quartinho de quinquilharias que se encontra dentro de nós. Pois sim, “quando morre um velho, arde uma biblioteca inteira” (Mia Couto). Estes sim estão cientes da vida, eles possuem muitos desses quartinhos, já perderam as contas de quantas vezes os arcos do tempo os laçaram. Para os jovens, saibam que diante dos idosos somos pequenos marujos que ainda não enfrentaram tudo o que o mar tem a oferecer, seja uma boa maré, até uma onda gigantesca que, volta e meia, pode afundar ou te deixar à deriva. O azimute, que é o norte para este oceano, está desenhado nos mapas que estão nas peles dessas pessoas, nas linhas de cada ruga.
Quer saber sobre a vida, nobre leitor? Então pare de ler este texto e vá conversar imediatamente com seu pai, sua mãe, avó, ou avô. Não naveguei o bastante, eles é que podem te dar um caminho pouco menos doloroso para atravessar estes mares bravios. Mesmo sabendo que a vida não é precisa e que cada um de nós é atirado para dentro dela à revelia, não há um alvo a acertar. Tudo é incerteza. Por isso deve ouvir quem sabe. Não a mim, um tolo de 35 anos, mas a quem já se encontrou e se perdeu várias vezes em seu quinquênio de ‘marujações’.
Cuidado! O tempo também é um gigante faminto que nos devora – a pintura de Goya que o diga. Nela (na pintura) podemos perceber toda a força desse elemento bravio e irredutível. É como se estivéssemos navegando dentro de um barquinho frágil e tendo que cruzar um oceano repleto de tempestades e dias claros. Nele, não há como sabermos o que virá, tais como flechas disparadas por um arqueiro cego.
Único, enfim, não existe volta àquele tempo em que vivemos determinados menino dos que um dia fomos, nem nos adolescentes, nem nos homens de meia idade que ultrapassamos. O que está feito, está feito. Não há poder que nos faça unir nenhum deles (exceto a música). Já passou, passamos. O que nos resta é continuar daqui para frente. Porém – é justo dizer – é interessante como falamos de forma tão orgulhosa sobre o quanto somos civilizados. Contudo – pasmem! –, há tribos indígenas que ainda conservam a figura do idoso como fonte primordial de sabedoria e aconselhamento do grupo. O que nós fazemos? Sim, é só passar na frente de um asilo. Lá podemos perceber o quão atrasada se tornou a nossa sociedade. Não queimamos, enlatamos bibliotecas e mais biblioteca e depois choramos quando elas se esvaem em fogo. Hipocrisia maldita!