Ana Souza
[email protected]
Críticas, elogios e um misto de revolta, tristeza, agonia e, acima de tudo, lembranças que jamais serão esquecidas e com o propósito principal: que a justiça seja feita para os 242 jovens vítimas e os 636 feridos no incêndio da Boate Kiss. Assim podemos resumir o que são as temáticas de duas produções que circulam nas telas, a série “Todo o Dia a Mesma Noite” baseada na obra da jornalista e escritora Daniela Arbex, e que estreou no dia 25 de janeiro pela Netflix; e a produção documental ‘Boate Kiss – A Tragédia de Santa Maria’ pela Globoplay, exibição desde 26 de janeiro. Em ambas as lembranças dos momentos dramáticos daquele 27 de janeiro de 2013 e que deixou pairando por Santa Maria uma nuvem cinza. Se passaram 10 anos e ninguém foi preso.
O julgamento, que havia sido marcado para 16 de março de 2020 foi adiado devido ao início da pandemia do Covid-19. Quase nove anos após o incêndio, em dezembro de 2021, o júri popular condenou os quatros réus a penas entre 19 e 22 anos. Após nove meses e a 1ª Câmara Criminal de Justiça do Rio Grande do Sul acolheu o recurso e anulou em agosto de 2022, por questões processuais, o julgamento de primeira instância. Os réus estão em liberdade, aguardando novo julgamento que não tem data definida.
Em ambas as produções são cinco episódios. Na série da Netflix, momentos de alegria, euforia e a tragédia iniciada com o incêndio da Boate Kiss. O desespero dos familiares em busca dos sobreviventes nas unidades de saúde e a luta de todos os envolvidos para salvar a vida de tantos jovens. A mensagem era que todos encontrassem força dentro de si. A temática da produção foi impactante, tanto que gerou alguns protestos com a exibição. A Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria emitiu uma nota de esclarecimento sobre. “Perante a divulgação em inúmeros veículos da imprensa acerca de um Processo contra a empresa Netflix em função da série “Todo o dia a mesma noite”, a Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da tragédia de Santa Maria esclarece através dessa nota que estávamos sim cientes que a produção estava sendo realizada com base nos personagens do livro “Todo dia a mesma noite: a história não contada da Boate Kiss” de Daniela Arbex, e sente-se representada por ela bem como pelo livro da autora.”
NA GLOBOPLAY
A produção refaz, passo a passo, a sucessão de acontecimentos que levaram à morte de tantos jovens e mostra as reviravoltas de um processo judicial cujo desfecho permanece imprevisível. ‘Boate Kiss – A Tragédia de Santa Maria’ é uma parceria com a TV OVO, coletivo de audiovisual de Santa Maria, e tem roteiro de Fernando Rinco e Gabriel Mitani, direção de produção de Clarissa Cavalcanti e produção de Andrey Frasson.
A série é conduzida e dirigida pelo repórter da TV Globo Marcelo Canellas, que passou a infância e a adolescência em Santa Maria, tendo se formado na mesma universidade federal onde boa parte das vítimas estudava. “A nossa ideia inicial era contar a história da Boate Kiss, tendo o julgamento como pano de fundo, imaginando que o julgamento iria chegar a um desfecho. No entanto, não houve esse desfecho porque o julgamento foi anulado. É uma história de luta de um grupo de mães, pais e sobreviventes por Justiça. E como esse sofrimento ficou sendo remoído ao longo do tempo e retornando como se fosse algo sem fim”, conta Canellas que, ao longo desses 10 anos, foi à cidade universitária gaúcha inúmeras vezes para cobrir os desdobramentos do caso. “Embora já esteja há 30 anos fora de Santa Maria, a minha relação com ela nunca se desfez, sempre se manteve muito próxima. E, obviamente, que, durante todo esse tempo, acabei construindo laços de amizade com as famílias”, afirma.
A série documental traz imagens inéditas do incêndio e depoimentos de testemunhas que presenciaram aquela madrugada de horror. Narra os desdobramentos da tragédia sob o ponto de vista dos sobreviventes e das famílias submetidas a uma longa e torturante espera pela responsabilização dos culpados da morte de seus filhos. A equipe acompanhou todo o julgamento que levou os réus à prisão, mas que acabou sendo anulado oito meses depois. “Eu vejo o que aconteceu em Santa Maria como uma grande alegoria do Brasil. De como o nosso país – seja nos meandros das instâncias judiciais, seja na forma como a sociedade reage – lida com uma tragédia dessa dimensão. Essas famílias merecem que suas histórias não sejam esquecidas. É uma série de alta voltagem emocional. E, apesar de ser um caso super conhecido, tenho certeza de que vamos surpreender com coisas que não foram ditas e mostradas até hoje”, diz Canellas.