Dia 01 de janeiro de 2014. Praia, calor, mercado lotado. Na fila do caixa, onde idosos, gestantes e pessoas com necessidades especiais têm a preferência, cenas de desrespeito.
Onze idosos e uma gestante se aglomeram, com poucas compras para pagar. Eis que surge uma mulher, de uns quarenta e poucos anos, com um carrinho lotado, e fura a fila. Uma senhora idosa que se sente lesada, mas que ainda não está na fila preferencial, põe-se a xingar a mulher, a qual responde apenas com um sorrisinho sarcástico.
A mesma senhora idosa tira proveito da situação para discutir a falta de respeito das pessoas com dois outros idosos que aguardam na fila… discute, discute, até que aproveita a deixa e fura a fila também.
Nesse momento, penso em me intrometer. Tenho vontade de chamar uma de idiota e outra de hipócrita. Mas respiro fundo, e me refugio no olhar inocente de um bebê, que sorri tranquilamente no colo de seu pai, sem compreender muito do que se passa.
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Pensando bem, nossa própria cultura já é falha, pois caixa preferencial em mercados, em bancos, bem como assento preferencial em ônibus, metrô, etc., pressupõem a falta de respeito enraizada na própria cultura. E por quê? Ora, se estamos no mercado, no banco, ou no ônibus, e vemos um idoso, uma gestante ou qualquer outra pessoa com algum tipo de necessidade especial esperando na fila, ou precisando sentar, nossa atitude genuinamente humana deveria ser a de deixar passar à frente, a de ceder o nosso assento, sem a necessidade de leis para assegurar tais ações.
Em alguns países, essa cultura de respeito funciona bem. Contudo, no Brasil quando funciona, é sob coerção. Não quero ser pessimista e nem generalizar o comportamento desrespeitoso supracitado, mas me parece que a mania de “ter os olhos virados para si” e a de “levar vantagem em tudo”, constituem cada vez mais o fio condutor da emancipação dos valores em nossa sociedade. Valores que subscrevem uma identidade contrastiva, do desrespeito, da dissemelhança, do “eu” sobre o “outro”.
As relações mútuas entre as gerações e entre as diferenças (sejam biológicas, étnicas, econômicas…) são cada vez menos governadas por formas especiais de cortesia. Em minha opinião, é com muito esforço que a nossa sociedade sobreviverá a esta crise de humanidade sem perder a possibilidade de renascimento moral.