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COP5: eleições em outubro, grandes decisões em novembro

Mara Pante

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O que é a COP 5
A produção de tabaco no País está ameaçada por constantes medidas restritivas que iniciaram em 2005, com a assinatura da Convenção Quadro para o Controle do Tabaco – CQCT. O setor já sofreu com os impactos de medidas aprovadas na 4ª Conferência das Partes – COP 4, realizada em 2010, que discutiu, em Punta Del Este, no Uruguai, os artigos 9 e 10 da Convenção-Quadro, que versam sobre a proibição do uso de alguns ingredientes na fabricação de cigarros. A decisão da COP 4 foi de recomendar a proibição do uso dos aromatizantes, pressionada especialmente pelo próprio governo brasileiro. Logo após a Conferência, em novembro de 2010 a Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa,  abriu consulta pública para discutir o assunto. Em março de 2012, a Resolução da Diretoria Colegiada – RDC 14 estabeleceu duros critérios para a comercialização de cigarros no País, proibindo ingredientes e alterando 99% das marcas de cigarros consumidas no País, um passo perigoso na direção do contrabando, de acordo com a Fundação Getúlio Vargas.
E, em novembro deste ano, a COP 5 será realizada na Coreia do Sul e preocupa muito as entidades vinculadas ao setor. A decisão a ser tomada sobre os artigos 17 e 18 poderá afetar toda a cadeia produtiva, uma vez que estão diretamente relacionados com a produção de tabaco no campo. Apesar de os termos se referirem a alternativas economicamente viáveis, é sabido que existe uma pressão muito forte para que haja limitação e redução da área de plantio.
 
Entenda melhor
Entre outras, na COP 5 podem ser adotadas as seguintes medidas, baseadas nos artigos 17 e 18, conforme documento preliminar divulgado em fevereiro:
– Limitar ou reduzir a área plantada com tabaco;
– Cortar os mecanismos de suporte aos produtores de tabaco (orientação tecnica das empresas, por exemplo);
– Acabar com os preços mínimos de suporte (tabela de preços mínimos);
– Controlar os preços do tabaco em folha e quaisquer suportes tecnológicos;
– Desmantelar organismos que promovem o tabaco (entidades que representam os fumicultores);
– Criar regulamentações ambientais que haveriam de discriminar o tabaco entre as safras agrícolas.
Como consequência viriam:
– Perda de renda no campo para mais de 222 mil pequenos produtores de tabaco (68% da renda do agricultor provêm do tabaco);
– Perda de arrecadação de impostos para 797 municípios produtores;
– Impacto direto nos cofres públicos, reduzindo drasticamente a arrecadação atual de R$10 bilhões em impostos;
– Grande incentivo ao comércio ilegal de cigarros, que atualmente é estimado em 30% do mercado total;
– Diminuição dos postos de trabalho que atualmente chegam a 2,5 milhões;
– Elevação do êxodo rural e migração das famílias para as cidades, o que ensejaria mecanismos de inclusão social a milhares de pessoas que estariam propensas à marginalização;
– Desmatamento de áreas verdes para desenvolver outras atividades de sustento, uma vez que o tabaco proporciona renda em pequenos lotes de terra.
 

Foto: Rolf Steinhaus
Posição do Brasil para a Convenção já está com a OMS em Genebra, mas setor desconhece o conteúdo. Enquanto isso, incerteza ronda a campo e as cidades que têm no produto uma das maiores fontes de renda 
 
 
SindiTabaco reclama da falta de transparência
O Sindicato Interestadual da Indústria do Tabaco – SindiTabaco vem alertando desde o final de abril, prefeitos de municípios onde o tabaco é produzido e entidades do setor, sobre o perfil da COP5, que acontece em novembro. Esta edição vai discutir fatores relacionados diretamente ao produtor e as informações que chegam – “todas extra-oficiais, porque nada que vai ser levado à Coreia é aberto antes – dão conta que o Brasil está liberando esse processo e vai adotar posição de risco para o setor, através de ideias e proposições altamente danosas. Esperávamos que nossas visitas e contatos com as prefeituras rendessem efeito na Marcha dos Prefeitos em Brasília, mas nada de concreto se ouviu”, desabafa o presidente do SindiTabaco, Iro Schünke.
O assunto hoje entrou definitivamente na esfera política, quem assina as proposições levadas pelo país é o Ministério das Relações Exteriores, mas as recomendações vêm da Comissão Nacional para Implementação da Convenção-Quadro – Conicq – e a essa, que tem como secretária executiva a médica Tânia Cavalcante, o setor não tem acesso. Existem apenas duas vias que podem intervir e afastar o setor do tabaco do rumo do despenhadeiro a que o próprio governo federal o está encaminhando: a política, através de prefeitos, deputados e senadores e a representatividade dos produtores, Associação dos Fumicultores do Brasil – Afubra e Federação dos Trabalhadores na Agricultura – Fetag, entre outras afins.
“Falam em diversificação, mas não é, é reconversão pura – a substituição de uma cultura de forma integral, o que está planejado e vem sendo levado a efeito”, denuncia o dirigente. “Países da Ásia e África estão querendo defender o setor em seus territórios e no Brasil é exatamente o contrário”, reforça. 
 
Foto: Junio Nunes
Iro Schünke: “só duas vias podem intervir e afastar o setor do rumo do despenhadeiro a que o próprio governo federal o está encaminhando: a política e a representatividade dos produtores”
 
 
Tarde demais para intervir, documento já está em Genebra
O presidente da Câmara Setorial, Romeu Schneider, é sincero ao admitir que agora é tarde demais para qualquer intervenção – os documentos com a posição brasileira a ser apresentada na COP5 em novembro, já estão em Genebra, com a OMS, que é quem pauta a convenção. Estão lacrados e não serão mais abertos até lá. O último prazo para tentar mudar a situação expirou em 25 de junho. No dia 21, a Câmara Setorial ainda se reuniu em Brasília, mas o representante dos ministérios, Rafael Barrocas, derrubou qualquer expectativa – “veio blindado, com mãos e pés amarrados e só falou o que lhe foi autorizado pela executiva da Conicq, Tânia Cavalcanti, que não aparece nas reuniões”, frisou Schneider. A Conicq diz que se opôs à determinação de reduzir e/ou limitar a produção de tabaco no país, mas que o secretariado da OMS derrubou a oposição e se recusou a excluir o item – “um dos únicos que beneficiaria o setor”, aponta o dirigente santa-cruzense.
Muita pressão e pouca explicação de parte do Ministério da Saúde e da Conicq – aliás, ninguém fala: os documentos encaminhados via Lula quando esteve em Santa Cruz e outros remetidos pela Câmara Setorial diretamente à Presidência da República e à Casa Civil, foram simplesmente encaminhados ao Ministério da Saúde e… ficaram por lá, sem resposta.
A atividade das ONGs antitabagistas, confirmadamente mantidas por organizações internacionais interessadas no fim do tabaco no Brasil vem pautando tudo – hoje elas são as maiores vilãs para o setor tabaco. Até mesmo os números usados nas entrevistas e campanhas são absurdos, alfineta o presidente da Câmara Setorial: “situam em R$21 bilhões o custo do governo/ano no tratamento de doenças originadas pelo tabagismo e que a arrecadação em impostos do setor é de apenas R$ 6 milhões/ano. Se sabe claramente que a arrecadação, pesando todos os impostos gerados ultrapassa os R$10 bilhões/ano. Usaram apenas os tributos do IPI”, conclui Romeu Schneider.
 
BLINDAGEM
Blindaram todos os membros da Conic – nenhum deles pode ter relação de amizade, parentesco ou algum interesse com alguém do setor tabaco no Brasil – os membros também não podem ir sozinhos às reuniões – têm de estar sempre acompanhados de seu superior imediato.
“Não consigo ver saída”, desabafa o presidente da Câmara Setorial, “somos impedidos de falar na COP5 – lá só o contraditório pode se manifestar, só aquele que fala a favor ou é antitabagista pode se pronunciar”.
 
FORÇA POLÍTICA
Em termos políticos, muito mais poderia ter sido feito pelos municípios da região produtora de tabaco, afirma Romeu Schneider. “Se não o foi é porque o governador Tarso garantiu, quando esteve aqui em Santa Cruz, no Clube União, que havia falado com a presidente Dilma e que o assunto tabaco estava resolvido. As lideranças acreditaram e não se mobilizaram em tempo”, lamenta.
 
Foto: Rolf Steinhaus
Incerteza frente às mudanças que poderão ser aprovadas debilita o brio do fumicultor
 
 
 
Foi um tiro no pé dado pelo Brasil
Para o vice-presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura – Fetag, Carlos Joel da Silva, a preocupação é grande, porque as discussões que irão à COP5, vêm de encontro diretamente ao produtor de tabaco: corte de recursos, proibição do preço de garantia e o combate e extermínio de entidades representativas do setor, como a Afubra, Fetag e mesmo o SindiTabaco. “Isso nos deixa estarrecidos, porque enquanto se combate ferrenhamente o cigarro, uma comissão de juristas do Senado que prepara o anteprojeto de reforma do código penal, aprovou a descriminalização do uso de drogas para consumo próprio”, pontua o dirigente. Ele também critica o “tiro no pé” dado pelo Brasil: “um país que produz e exporta tabaco não assina uma convenção destas, viramos boi de piranha”. Segundo ele, algumas pessoas do governo têm essa visão e extrapolaram a questão da saúde – não é só o tabaco que causa câncer – e partiram para uma espécie de preconceito sobre o produto. Nesta quinta-feira, 28, a Assembleia Legislativa discute o envolvimento dos governantes dos três estados do sul – “vamos deixar de demagogia”, pontua Joel, lembrando que o assunto adotou mais o teor ideológico que as próprias questões econômicas e sociais envolvidas.
 

Executivo articula vinda do presidente da Anvisa em julho
O vice-prefeito Luiz Augusto Costa a Campis (PT) contatou com o deputado federal Marco Maia (PT) há cerca de duas semanas, para que este intermediasse a vinda do diretor-presidente da Anvisa, Dirceu Brás Aparecido Barbano, a Santa Cruz em julho. “Vamos mostrar à Anvisa a organização da nossa cadeia produtiva. Até agora eles só viram números, agora poderão constatar nossa realidade e isso pode sensibilizar e apresentar uma posição mais moderada em Genebra. Essa é a última de uma série de articulações políticas entabuladas pela Prefeitura com relação às dificuldades impostas pela Convenção Quadro. A prefeita Kelly Moraes participou de inúmeras reuniões pela Associação dos Municípios do Vale do Rio Pardo – Amvarp, encaminhou documentos aos ministérios e foi à Brasília tratar pessoalmente da questão. “A Prefeitura não está de braços cruzados, nem nunca esteve”, garantiu o vice Campis. Ele pede atenção da população para não se deixar intimidar por terrorismos publicados, pois não há determinação alguma que fale da proibição da produção de tabaco e sim de limitação, redução, restrição de consumo. “Não aceitarei nada quanto à proibição, iremos brigar com certeza”, reforçou. Ele lembra ainda que a guerra antitabagista não teve início com a assinatura de Lula à Convenção Quadro – Lula assinou uma proposta pronta feita pelo então Ministro da Saúde, José Serra. “O ato foi uma política de Estado e não de governo”, diferenciou ainda o vice-prefeito santa-cruzense.
 
Foto: Rolf Steinhaus

Campis, vice-prefeito de Santa Cruz do Sul: “se a  decisão for proibir a produção, vamos brigar com certeza”
 
 

Porque tanto mistério com a posição que vai ser levada pelo Brasil?
“O debate sobre a produção de fumo na Comissão de Agricultura da Assembleia Legislativa esta semana abre condições para que a posição do Br
sil seja mais favorável do que achamos que vai ser”, entende o presidente da Associação dos Fumicultores do Brasil – Afubra, Benício Werner, apesar de o documento oficial com a posição brasileira já estar em Genebra com a OMS desde o dia 25. A reunião foi proposta pelo deputado estadual Marcelo Moraes (PTB) para que as entidades se mobilizem antes da conferência e consigam ser ouvidas, diferente do que ocorreu na COP 4, realizada no Uruguai. 
“Até agora só temos conhecimento do documento preliminar lançado na internet em fevereiro”, aponta Benício. “Se a posição que sair da COP5 emitir determinação aos governos para reduzir área de plantio, por fim ao preço de garantia e desmantelar organismos que promovem o tabaco (conforme consta neste documento) vamos adotar posição radical, pois estaremos sendo atingidos”, avisa o dirigente dos fumicultores. Segundo leitura dele, o comprometimento dos candidatos à prefeitura e vereança este ano é muito mais forte por estarem diretamente relacionados aos produtores – “é bem mais difícil cobrar de um governador ou executivo federal”, delineia. Mas a principal preocupação e dúvida do presidente da Afubra é quanto ao teor da posição brasileira para a COP5, que segundo o governo será divulgado em agosto, três meses antes do evento na Coreia do Sul. “Porque um documento feito e/ou ratificado por brasileiros não pode ser de conhecimento dos brasileiros”, questiona.
 
Foto: Camila Kaufmann
Participaram da reunião os deputados Edson Brum (PMDB) e Marcelo Moraes (PTB), Aloísio Classmann (PTB), Ernani Polo (PP), Edson Brum (PMDB) e representantes da Afubra, Fetag/RS, Sicredi e SindiTabaco.