Ana Souza
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Uma cidade, Santa Maria, e um país inteiro, o Brasil, seguem em luto. Sexta-feira, 27, será mais uma marca ruim a ser lembrada. Serão dez anos de uma tragédia que até hoje não teve o desfecho esperado pelos familiares e amigos das vítimas da Boate Kiss. Foi em 2013, em Santa Maria, que todo o país teve um grande momento de comoção. Nada será esquecido, um grito de alerta para que algo semelhante nunca mais se repita.
A repercussão foi tamanha que a Netflix e a Globoplay estão divulgando esta semana duas séries. O primeiro capítulo da série que engloba emoções, momentos sombrios e comoventes, será exibido pela Netflix na quarta-feira, 25. “Todo o Dia a Mesma Noite” é baseado na obra, de mesmo nome, da renomada jornalista e escritora Daniela Arbex. A série será dividida em cinco episódios que contam a história real da tragédia na Boate Kiss e que deixou 242 mortos e 636 feridos e levou às lágrimas a cidade de Santa Maria e transbordou pelo Brasil inteiro. Na temática, além da tragédia, a busca por justiça dos familiares e amigos das vítimas do incêndio. A direção-geral é de Julia Rezende, direção de Carol Minêm e roteiro de Gustavo Lipsztein. No elenco Thelmo Fernandes, Paulo Gorgulho, Bianca Byington, Leonardo Medeiros, Débora Lamm, Bel Kowarich, Raquel Karro, Paola Antonini e Nicolas Vargas.
Já a nova série documental “Boate Kiss: A Tragédia de Santa Maria”, da Globoplay, terá sua estreia na quinta-feira, 26. Dividida em cinco episódios, a produção, é dirigida pelo jornalista gaúcho Marcelo Canellas. Em parceria com o coletivo audiovisual de Santa Maria TV Ovo, irá relatar o sofrimento de pais e de sobreviventes do ocorrido. Mostrará os acontecimentos que levaram à morte 242 e feridos 636. O documentário ainda mostrará a luta por justiça e os trâmites do processo judicial. O roteiro recebe assinatura de Fernando Rinco e Gabriel Mitani. Direção de produção de Clarissa Cavalcanti e produção de Andrey Frasson.
JAMAIS SERÁ ESQUECIDA
Foi em 27 de janeiro de 2013 que a boate Kiss, localizada na área central de Santa Maria, sediou a festa universitária denominada “Agromerados”. No palco, se apresentava a Banda Gurizada Fandangueira. Foi neste instante que começava a se delinear a maior tragédia já vista no Rio Grande do Sul. Um dos integrantes disparou um artefato pirotécnico cujas centelhas atingiram parte do teto do prédio, que era revestido de espuma e que acabou pegando fogo. O incêndio se alastrou rapidamente, causando a morte de 242 pessoas e deixando 636 feridos. O evento tinha sido organizado por estudantes dos cursos de medicina veterinária, agronomia, zootecnia, técnico em agronegócio, técnico em alimentos e pedagogia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).
LUTA QUE SEGUE
Além de toda a tristeza com a tragédia, os familiares e amigos das vítimas ainda tiveram mais uma notícia ruim no dia 3 de agosto de 2022, quando em sessão de julgamento exclusiva, que analisou os recursos que questionam a sentença do Caso Kiss, por 2 votos a 1, a 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul anulou o júri que havia condenado os quatro réus, em 10 de dezembro de 2021. Com o provimento das apelações da defesa, foi revogada a prisão dos apelantes. Os sócios da Kiss, Elissandro Callegaro Spohr e Mauro Londero Hoffmann, o vocalista da Banda Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus dos Santos, e o auxiliar do grupo musical, Luciano Bonilha Leão, estão em liberdade.
Muita força para seguir em frente
“Infelizmente lá se foram dez anos e ainda a situação judicial não foi finalizada. Isso certamente mantém o sofrimento das vítimas e dos familiares. Estou confiante que em breve teremos um julgamento final e que a justiça puna os responsáveis pela triste tragédia. O dia 27 é um momento de muita reflexão, emoção, tristeza e recordações. Passa uma novela dos fatos e da complexidade da tragédia. Mas também traz lembranças positivas de muitas vidas sendo salvas…A série da Netflix certamente será impactante. Pelo que sei é um relato mais detalhado do ocorrido e dos seus bastidores. Os personagens são baseados no livro da Daniela Arbex. Esse escrito de uma forma ética e respeitosa. A minha história é contada no primeiro capítulo, chamado “É guerra” e será interpretada pelo ator Pablo Sanabio. Ele representará o trabalho de um exército de profissionais da área da saúde e de voluntários que lutaram para salvar vidas. Fiquei muito honrado em poder ser o representante deles no livro. Sobre a anulação do júri é um completo absurdo. Foi algo decepcionante e inacreditável. Dez anos se foram e a morosidade da justiça brasileira persiste. Espero que tudo se resolva muito em breve para que os familiares e as vítimas possam ter finalmente sua paz”, frisa doutor Carlos Fernando Drummond Dornelles, médico que coordenou o gerenciamento de crise na tragédia da Boate Kiss. Atualmente faz a rotina da sala vermelha da emergência do Hospital Santa Cruz em Santa Cruz do Sul, desde março de 2016.
“Deveríamos estar comemorando a justiça sendo feita, o tribunal do júri deu a sentença e esta foi contundente em relação aos reús, o problema foi que a justiça entendeu de anular o júri. O processo continua em julgamento e esperamos que se reverta e que se mantenha a decisão que condenou os réus e que seja o mais breve possível. Não foram somente os quatro réus, outras pessoas não tiveram o devido julgamento e lamentamos por isso. Chegar aos dez anos, sem a justiça sendo feita, é de fato muito triste para os familiares da tragédia da Kiss. A série da Netflix, inspirada na obra de Daniela Arbex, é mais uma que vem trazer para toda a sociedade o que aconteceu na noite de 27 de janeiro de 2013 e que iremos perceber que os jovens estavam em uma verdadeira ratoeira, em local impróprio para a realização de eventos deste porte. É importante que a sociedade toda tome conhecimento e que a luta que mantivemos não seja perdida e que tais eventos não se repitam mais, com tanta irresponsabilidade. A luta é por nossos filhos e por uma sociedade melhor! O respeito à vida! É muito triste não termos tido a convivência do Matheus nestes últimos dez anos, um menino fantástico e maravilhoso que estudava muito e já estaria com seu doutorado pronto e poderia contribuir muito com a sociedade, assim como os demais colegas que perderam a vida. Triste também para os que sobreviveram que ficaram com sequelas desta tragédia que o Rio Grande do Sul e o País viveram e que nunca mais se repita!”, professor Nestor Raschen, pai do jovem Matheus Rafael Raschen, uma das vítimas da Kiss.