Tenho assistido a algumas competições dos Jogos Olímpicos de Londres. No último domingo assisti à final feminina dos saltos ornamentais em trampolim de 3 metros. Eram 12 finalistas e a prova era em 5 séries, cada atleta saltava uma vez em cada série. Havia duas representantes da China e as outras 10 representavam outros 7 países. Aquela competição poderia ser vista de muitas formas. Existem critérios técnicos como a altura alcançada no salto, as piruetas no ar, o posicionamento do corpo ao entrar na água e a quantidade de água movimentada na caída. A competição poderia também ser apreciada pela beleza plástica, tendo em vista os corpos esculturais das atletas. Mas o que mais me inquietou foram dois flagrantes das câmeras que transmitiam as imagens. O primeiro deles foi entre a apresentação das atletas e o início da prova. Enquanto, após serem anunciados seus nomes, as atletas foram se molhar na grande banheira ao lado da piscina ou nas duchas, e começaram um aquecimento físico, a competidora chinesa Minchia Wu sentou-se no chão escorando as costas na parede, cobriu-se com uma toalha branca e fechou os olhos. Esta imagem foi mostrada por um segundo, e ela parecia estar em profunda concentração.
Começou a prova no trampolim de 3 metros, e as chinesas Minchia Wu e Zi He se sobressaíam sobre as demais, alternando entre elas a liderança em pontos desde o início. Minchia Wu seria a última a saltar na quinta e última série. Naquele momento a soma de pontos de qualquer das competidoras que haviam saltado 5 vezes não alcançava os pontos de apenas 4 saltos da Minchia Wu, exceto a Zi He. Próximo daquele momento, entre um salto e outro das outras atletas, apareceu por 2 segundos novamente a imagem da Minchia Wu sentada no chão com as costas na parede, fone de ouvido e olhos fechados. O que estaria ela ouvindo e pensando? Este foi o segundo flagrante das câmeras que me deixou inquieto, muito mais do que o momento em que ela ganhou a medalha de ouro, quando a vi sorrir pela primeira vez, e chorar emocionada.
É notória a supremacia chinesa em muitos esportes, e isso pode ser visto pela liderança no quadro de medalhas. Foi assim em 2008 em Pequim, é assim em Londres. Que filosofia leva tantos atletas de um país à superação? Fiquei imaginando o que a Minchia Wu poderia estar escutando naquele momento. Seria algum texto do clássico chinês A Arte da Guerra? A Arte da Guerra é um livro escrito há 2.500 anos por Sun Tzu, um filósofo chinês que se tornou general. É um livro do qual seus textos podem ser aplicados em qualquer atividade humana em que haja concorrência ou competição. Su Tzu nos diz que “antever a vitória quando ela é óbvia não é sinal de excelência ou brilhantismo. Pegar uma folha de outono caída não requer grande força, ver o sol e a lua não indica olhos perspicazes e escutar o trovão não exige ouvido aguçado. Portanto, bons guerreiros obtêm vitórias por não cometer erros e por se posicionar no lugar onde sabem que vencerão… O exército vitorioso primeiro vence e depois parte para a batalha. O líder sábio observa rigorosamente o método e a disciplina, e o controle do sucesso está, portanto, em suas mãos… A força militar tem cinco regras: medição, estimativa, cálculo, ponderação das chances e vitória.”
A filosofia milenar chinesa contempla as atividades humanas em todas as esferas. Entretanto, não se faz atletas de alto rendimento apenas com filosofia. É preciso mais. É preciso uma educação que mostre e deixe claro o valor da disciplina. É preciso que se multipliquem centros de treinamentos pelo país, incentivando a prática esportiva como promotora de saúde e de inclusão social, como educadora física, emocional e competitiva para a vida, e como formadora de atletas que serão símbolo e inspiração para milhões de crianças e jovens. Esses valores parece que a China tem.