Ana Souza
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Lembrar dos primeiros habitantes que aqui aportaram e fizeram surgir nossa Santa Cruz do Sul nos faz voltar aos hábitos dos colonizadores. A vida não foi nada fácil para eles. Tinham que preparar a terra para o plantio e assim poder ter o alimento na mesa a cada dia. Se assim não fizessem, não tinham como se alimentar. Parte da produção era comercializada para que pudessem adquirir o que não plantavam. Quem não lembra de um prato típico que a mãe ou avó ensinou e que hoje faz parte da nossa mesa, trazendo o doce sabor dos antepassados?
A culinária reflete os costumes de um povo e demais aspectos culturais É a arte de cozinhar os alimentos. Foi evoluindo com a história da humanidade e características diferentes em cada cultura. Em entrevista para o caderno especial do Dia do Colono e do Motorista, a professora do Colégio Mauá, Maria Luiza Rauber Schuster, diretora do Museu do Mauá, nos fez voltar ao passado e lembrar dos costumes dos primeiros imigrantes e como eles cultivavam os alimentos e os preparavam.
Conhecer o que poderia ser cultivado foi o primeiro passo dos imigrantes. “Todas as estações eram inversas ao momento em que eles conheciam. Chegaram aqui no verão, quando na terra de origem era inverno. Tinham que pensar no que cultivar e o que daria certo, fazer muitas experiências. Conheciam a cevada, o centeio, aveia, abóbora mas, não tinham experiência com batata doce e assim vários produtos que eram possíveis de fazer brotar na terra nova. A persistência deles foi adiante e aos poucos foram cultivando os produtos para que pudessem alimentar a família e também comercializar através dos comerciantes de Rio Pardo que levavam as mercadorias para as docas em Porto Alegre.”
O verão, com as altas temperaturas, foi um ítem que dificultou as culturas. “Não podiam plantar no sol quente e assim ganhavam subsídios para se sustentar e, logo que puderam foram semeando as plantações. A culinária foi ganhando novidades com as frutas, não tinham experiência com laranjas e nem bergamotas. Estas vinham das terras mais quentes da Costa do Mediterrâneo. Naquele período, em 1849, não existia fartura. Lá passaram muita miséria e fome e quando aqui chegarem foram agregando o aprendizado. Trouxeram mudas de parreiras e as cultivaram e com isso produziram a geléia, as cucas com uva e a de streusel (farelo de açúcar) e a de pêssego.”
Com o passar do tempo os colonizadores foram expandindo suas plantações. “Passam a conhecer muitas coisas que a terra poderia oferecer como a goiaba, o araçá, a guavirova, enfim frutos da mata. A culinária foi sendo incrementada com a introdução do arroz com feijão. Este causou estranheza, lembro de uma história lá dos anos 50, de uma família da Alemanha, em que uma vovó não comeu, de forma alguma feijão, porque estranhava o alimento de cor escura no prato. Conheciam a lentilha e grãos que usavam nos pães, inclusive o pão branco que era o de festa por ocasião de casamentos e do tradicional kerb. A farinha branca era mais cara do que a de centeio e de milho. Os alemães trouxeram um up para a culinária no Rio Grande do Sul com as receitas que levavam recheios, tais como os doces de frutas que iriam servir para os bolos e as tortas. Faziam as tortas de maça, papo de anjo, ambrosia e quindim, enriquecendo a culinária gaúcha.”
Na parte dos salgados a preparação da batata era de várias formas, a assada, purê, frita e cozida e inclusive comida com casca e molho branco, essa era a maionese da época. “Também na mesa a galinha recheada e as carnes assadas com temperos específicos, com menos sal e mais incrementos. Muitos alimentos produzidos naqueles tempos e que seguem até hoje. As massas, tradição italiana, foram agregadas com os cless, o inhoque. O repolho para se fazer o chucrute e os embutidos com uma gama de variedades e cada um com seu tempero. Tudo isso foi sendo adaptado na vida dos imigrantes que, primeiramente, tiveram que se estabelecer para depois aprender o que cultivar. Um dos exemplos era a produção das bebidas feitas de forma artesanal e para ocasiões específicas e festivas. A produção da cachaça, o melado, o açúcar mascavo e as rapaduras também fizeram parte das adaptações. Não conheciam a cana de açúcar, um produto que os alemães aprenderam com os lusos. Podemos dizer que temos uma grande riqueza, presente no cafés coloniais, que fez surgir uma culinária fantástica em nosso Rio Grande do Sul.”