A moral é um assunto de importância vital em qualquer sociedade. Ela diz respeito àquilo que se considera certo e errado, correto e incorreto, bom e mau. Seu vínculo com a política é muito forte: o cidadão comum costuma utilizar noções morais para julgar os políticos, como “boa pessoa”, “ingrato”, “egoísta”. Se governo é visto como “bom”, sua aceitação social fica fortalecida. Do contrário, fica enfraquecida.
Em vários momentos da história brasileira, o discurso moral entrou na cena política com muita força: foi em momentos de implementação de reformas econômicas, sociais e políticas, com Getúlio Vargas e João Goulart, e vem sendo assim com Lula e Dilma. Nesses momentos, a moral foi transformada em “moralismo conservador”.
O moralismo conservador não está preocupado com mudanças em favor da justiça social, da inclusão social, do combate à pobreza, de preservação ambiental e outras questões fundamentais do ponto de vista moral. O moralismo foca em fatos e aspectos particulares das instituições políticas, suspeitas de corrupção. “Corrupção” é a palavra mágica para o moralismo. Toda a complexidade da política é reduzida à corrupção (dos adversários).
O moralismo conservador é uma visão distorcida da moral, típica de elites e oligarquias ocupadas em manter tudo como está. O moralismo olha a parte e não olha o todo. Olha, por exemplo, certos problemas (dos outros) no presente e deixa de lado suas raízes históricas; faz escândalos sobre fatos reais ou supostos de corrupção (dos outros), mas não se constrange em justificar as desigualdades sociais, o fato dos pobres pagarem mais impostos que os ricos, o olho gordo das empresas internacionais de petróleo sobre o nosso pré-sal. É uma visão caolha, que não se espanta com o fato de que vários casos suspeitos escapam constantemente da mão dos investigadores.
A visão moralista constitui um perigo para a democracia, especialmente sob a combinação de forças políticas reacionárias, mídia concentrada em alguns grupos familiares e interesses de grandes corporações nacionais e internacionais. A mídia transforma as investigações e julgamentos em espetáculos diários. Os telejornais ditam o ritmo e até o conteúdo das investigações. Deslumbrados com os holofotes, certos agentes públicos assumem um ar salvacionista, como se estivesse a seu alcance mudar a política e a vida em sociedade.
Contra o moralismo é preciso defender um senso moral equilibrado, lúcido e com visão histórica. Esse senso proporciona ao povo o discernimento necessário para apoiar a apuração e a punição dos mal-feitos, sem poupar alguns e condenar outros, protegendo as riquezas do país e exigindo a continuidade das reformas em curso em favor do combate à pobreza e em favor da inclusão social. A moral ajuda a defender as conquistas de inclusão social e combate às desigualdades.
O moralismo hoje propõe o golpe. Para quem ainda não se deu conta dos seus riscos à luz da história brasileira, vale lembrar o exemplo da Itália: depois da “Operação Mãos Limpas”, quem ascendeu ao poder foi Silvio Berlusconi, empresário bilionário, neoliberal e condenado mais tarde por corrupção. Moral tacanha, política tacanha.