Lucca Herzog
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O antigo Sanatório Kaempf – ou Vida Nova, em seus últimos anos – completou 134 anos no mês de novembro. Uma das primeiras instituições fundadas na cidade, o sanatório começou a ser construído por Eduardo Kaempf, ao final do século XIX. Localizado na saída de Santa Cruz para Sinimbu, ao longo dos anos o espaço abrigou, além dos pacientes, a família Kaempf, que também morava nas dependências, em uma edificação adjacente. O último administrador do Sanatório, Ivo Kaempf, nasceu no local, que funcionou como clínica até 1999. Ivo criou os filhos ali, até que, em 2018, na véspera dos 130 anos do Sanatório, a propriedade foi adquirida pela Faculdade Dom Alberto, e a família mudou-se.
História centenária
O Sanatório Kaempf foi fundado em 15 de novembro de 1889, dia da Proclamação da República. O alemão Carl Hermann Eduard Käempf veio para o Brasil em 1882, e quatro anos mais tarde começava a construir as fundações do prédio. Ali, o médico tratou principalmente de doenças reumáticas, como a tuberculose, com um tratamento hidroterápico, à base de água e barro. A partir de 1905, a estrutura do local foi expandida, e o local tornou-se um hospital geral.
Arthur Valter Kaempf, filho do fundador, continuou com os tratamentos hidroterápicos até 1956, quando faleceu, e o local permaneceu como hospital até 1973. Nesse ano, iniciou-se o período da clínica psiquiátrica, que perdurou até 1999. Quando a clínica fechou, o local transformou-se no Recreio Vida Nova, com internos remanescentes e pensionistas. Até 1999, 80 mil pessoas haviam passado pelo Sanatório Kaempf.
Estigmatização
A vida dos Kaempf era integrada à do Sanatório, e a família sempre esteve envolvida com o local. Apesar da normalidade com que encaravam a situação, a instituição sempre foi um tabu. Entretanto, de 1949 até 1973, o local era um hospital geral. Só na década de 70 o hospital torna-se um centro psiquiátrico, e começa a receber pessoas com distúrbios mentais e usuários de drogas.
As doenças mais comuns tratadas no Sanatório eram depressão, alcoolismo e até mesmo estresse. Como o próprio Ivo Kaempf elucida, sanatório vem do termo “sanar”, e é o lugar onde são tratados diversos tipos de doenças e onde, antigamente, tratava-se a tuberculose. “Meus filhos se criaram lá dentro”, explica Ivo. “Nunca teve problema com paciente nenhum. Sempre nos demos bem, e sempre procuramos tratar todo mundo como se fosse família. Vimos coisas boas, coisas ruins. Isso acontece com cada um.”
Entretanto, segundo ele, essa harmonia era resultado do trabalho e da apropriada administração da casa, dos funcionários e do histórico dos pacientes: “Quando chegava alguém lá, tínhamos que conhecer a pessoa. Pesquisava-se o que a pessoa achava, ou por que estava lá, por que procurava o atendimento médico. Na conversa, nós sabíamos lidar com respeito. […] O paciente tinha que entrar sabendo que o conhecíamos”.
Ivo revela ainda, dentre muitas histórias, a de um antigo paciente, que marcou sua memória. “Tínhamos um paciente que morou lá por 50 anos. Quando ele faleceu, a família mandou uma caravana, com um caixão dentro, pra levar ele de volta pra casa. Mas eles não esperavam que minha mulher e eu acompanharíamos a caravana. Ele era praticamente da família, festejava os aniversários, natal, páscoa e ano novo. Estava sempre junto”, relembra.
A mudança
Com a criação da Lei Antimanicomial, que instaurou uma reforma psiquiátrica, que impediu a ampliação de hospitais psiquiátricos e reduziu as internações compulsórias, o Sanatório começou a enfrentar dificuldades financeiras, e ficou cada vez mais difícil sustentá-lo. Em 1999, a entidade foi encerrada, e, em 2018, a família Kaempf, que mistura sua história com a do prédio, mudou-se para outra residência. “A mudança, foi violenta”, relembra Ivo. “Eu nasci lá dentro, e fiquei praticamente a vida inteira lá. Eu aprendi muito lá, com o que a vida ensinou. A vida é o maior professor. […] A saudade sempre fica, é uma coisa que não se esquece. Quando eu me mudei, escrevi em um quadro negro: A despedida não é o fim, mas o início de uma saudade”.