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Lucca Herzog
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Cada língua é uma riqueza, um arcabouço cultural que nos permite conhecer e representar o mundo de uma forma única, incomparável. A Língua Brasileira de Sinais (Libras) é apenas uma das muitas línguas utilizadas pelo globo. De acordo com a Federação Mundial de Surdos, a população de pessoas surdas – principal usuária das línguas de sinais – soma mais de 70 milhões em todo o mundo. Coletivamente, eles usam mais de 300 línguas de sinais, cada uma com suas especificidades.
Ainda há, no entanto, muitos desafios para um usuário dessas línguas. E, em meio à conjuntura atual, diante dos fenômenos da globalização e da internet, o santa-cruzense Nelson Goettert vislumbrou a temática de pesquisa de sua maior conquista acadêmica: a defesa da tese de doutorado. Hoje professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) no Departamento de Libras, Nelson foi o primeiro aluno surdo a defender uma tese no PPGL (Programa de Pós-Graduação em Letras) da Universidade, onde conquistou, recentemente, o título de Doutor, com sua pesquisa sobre o tema: “Spread The Sign Brasil: Análise E Sugestões Para Sua Melhoria”, orientado pela professora doutora Cleci Regina Bevilacqua.
Em sua pesquisa de definição da tese, Nelson desenvolveu um trabalho com sugestões para a melhoria da Spread the Sign Brasil (STS). O STS é uma plataforma digital com fins pedagógicos, com informações sobre diferentes línguas de sinais, entre elas a Libras. No Brasil, sua organização é coordenada pelo próprio Nelson. O programa constitui-se como um grande dicionário das línguas de sinais, e oferece informações como: palavra ou expressão em português, definição, sinal em vídeo e imagem.
A investigação do professor teve como objetivo analisar o STS-Brasil, ou seja, suas informações referentes à Libras e ao português, a fim de identificar possíveis lacunas e propor sugestões para seu aprimoramento. Seguindo a fundamentação teórica da Lexicografia Pedagógica, o estudo oferece um levantamento de dicionários em Libras, a análise de cinco dicionários online e o exame detalhado do próprio STS-Brasil, seguido de propostas para algumas lacunas identificadas no sistema. “A expectativa e perspectiva são de que possa melhorar o uso do Spread, e com isso contribuir para que os surdos, e também os ouvintes, possam ter um melhor acesso às informações, ao vocabulário e aos sinais que estão dispostos na plataforma”, explica o autor.
A trajetória
O resultado acadêmico final é fruto de um percurso de muitos desafios para Goettert. Como um dos maiores, ele destaca a pandemia da Covid. “A pandemia acabou limitando a interação que eu poderia ter com as pessoas, por causa do isolamento, dessa falta de contato, quando poderia fazer entrevistas pessoalmente”, exemplifica.
Remonta a 2022, entretanto, o ponto que marcou uma retomada de ânimo para o trabalho, quando Nelson teve a oportunidade de viajar à Europa, e visitar vários países da região. “Quando finalmente a pandemia foi diminuindo, e a gente retornando à vida presencial, eu consegui viajar à Europa para fazer entrevistas em Portugal, Espanha e Alemanha, e acrescentar isso ao meu trabalho”. Já na cidade de Orebro, na Suécia, o estudante completou seus estudos sobre o dicionário de Língua de Sinais: “Me sobrava pouco tempo para a escrita, por causa do prazo, mas eu consegui escrever, consegui terminar”.
Em retrospectiva, o pesquisador confessa que nada disso seria possível sem o apoio da família e o incentivo do pai, que o instigou a perseverar nos estudos e a seguir suas pesquisas até o ensino superior: “Agradeço imensamente o meu pai Niro Amadeo Goettert (in memoriam) que me ensinou sobre a importância do respeito e, me respeitando sempre, me motivou a estudar […], me desafiou para que me esforçasse e conquistasse meu título de doutor, algo que finalmente conquisto hoje. Tinha esperança até meu doutorado final, mas ele foi pro céu no ano 2021. Com certeza, ele tá festejando lá no céu na minha comemoração de conquista do meu doutorado”.
Para a instituição da UFRGS, a conquista de Nelson também representa um incentivo importante para a proposição da política de Ações Afirmativas (AAs) nas universidades, que, por sua vez, facilita o ingresso de pessoas surdas em programas de pós-graduação: “Tal iniciativa deve não apenas assegurar o ingresso do público visado, como também, principalmente, garantir sua permanência, o que requer ampliação do número de bolsas, contratação de tradutores e intérpretes de Libras para atender a crescente demanda, destinação de recursos para adaptação de espaços que permitam a adequada acessibilidade aos diferentes grupos abarcados pelas AAs, além da sensibilização da comunidade para acolher esses grupos”.
