LUÍSA ZIEMANN – [email protected]
“E a gente vai à luta, e conhece a dor, consideramos justa toda forma de amor.” Lulu Santos não conhece Indara e Andressa e tampouco deve ter se referido a elas ao escrever esse trecho da clássica canção Toda forma de amor, porém a estrofe cabe perfeitamente com a história dessas duas mulheres. No último sábado, Indara Tarimã de Souza, de 21 anos, e Andressa Aparecida da Silva, de 26, realizaram um sonho que, até pouco tempo atrás parecia muito distante: celebraram sua união religiosa. Com o pé na areia, de frente para o mar.
Convivendo e lutando diariamente contra a homofobia, o casal acredita que realizar o sonho de casar na praia foi mais uma forma de quebrar a barreira do preconceito. “Infelizmente ainda existe muito isso na sociedade, não somente olhares como também comentários. Às vezes escuto frases como “nem parece que tu gosta de mulher” ou se vou comprar algum presente recebo frases do tipo “é pro teu namorado?”, conta Indara. “São frases que para as pessoas parecem inofensivas ou não preconceituosas, mas no fundo são. A sociedade está acostumada a ver um casal como um homem e uma mulher e em certas falas vemos esse preconceito velado.”
Indara e Andressa, que são umbandistas, se conheceram através da religião. “A Andressa foi convidada por um integrante do templo que frequento a participar de uma festa. Desde então começou a frequentar a casa e aos poucos fomos nos conhecendo”, conta a auxiliar administrativa. O casamento das duas, que foi realizado no último sábado na beira da praia de Capão da Canoa, reuniu familiares e amigos do casal e seguiu todo o ritual umbanda. “Nosso sonho sempre foi casar na praia. Eu sou filha de Iemanjá, amo estar na praia, olhar para o mar, sentir a maresia. É uma forma de me conectar com a ancestralidade.”
Para Indara, a homossexualidade sempre foi tratada de maneira muito natural com a sua família. “Tenho um irmão que também é gay e a aceitação dos nossos pais em relação a isso foi muito tranquila. Meu irmão, que é mais velho, acabou sofrendo mais preconceito do que eu pela sociedade, pois agora já é algo mais comum do que dez anos atrás. Então, quando ele se assumiu homossexual o preconceito era gigante, mas ele conseguiu superar isso muito bem, pois sempre teve o apoio dos meus pais, assim como eu tive.”
Da mesma forma aconteceu com Andressa. “A família também sempre aceitou ela da forma que ela é, entendeu suas escolhas e nos apoiou. E isso é muito bonito. Uma família respeitar as escolhas dos filhos.” O casamento de Indara e Andressa – que foi celebrado por Pai Antônio, cacique de umbanda de ambas – tem um significado ainda mais forte e especial para ambas: além de exaltar o amor existente entre as duas, o casal espera que a oficialização religiosa do matrimônio incentive outros homens e mulheres homossexuais, sobretudo os mais jovens.
Indara quer levar à sociedade uma mensagem que pode ser resumida em uma das expressões mais famosas existentes: Omnia vincit amor, em latim. Ou no bom e velho português: o amor vence tudo. “Durante a cerimônia, inclusive, o Pai Antônio, que é nosso cacique de umbanda, fez uma fala muito interessante, onde retratava o quanto o nosso casamento era importante para outras pessoas, quantas novas portas estamos abrindo, quantas oportunidades de outras pessoas se espelharem em nós, e verem que sim, que é possível, que amor é capaz de superar qualquer barreira.”