LUANA CIECELSKI
[email protected]
Condenado. Esse foi o resultado unânime do julgamento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva que aconteceu em Porto Alegre na última quarta-feira, 24 de janeiro. Ele foi considerado culpado de corrupção e lavagem de dinheiro pelo caso do triplex no Guarujá, em São Paulo e teve sua pena aumentada de 9 anos e 6 meses para 12 anos e 1 mês pelos três desembargadores que analisaram o caso em segunda instância. O resultado final dos votos foi anunciado por voltas das 18 horas, cerca de 9 horas após o início do trabalho.
Por parte do Ministério Público a acusação se manteve – recebimento de um triplex no Guarujá como forma de propina por esquemas de corrupção junto à Petrobras. A defesa de Lula, por sua vez, representada pelo advogado Cristiano Zanin Martins, destacou a falta de provas periciais, o que acarretaria em uma nulidade do processo. Ele também enfatizou o fato de o triplex ser da OAS. “O triplex não é do ex-presidente Lula, todos sabem que sempre pertenceu à OAS”, disse. “Ficou claro pelas provas dos autos que ele jamais recebeu as chaves, passou um dia ou uma noite”, continuou. Por fim, ele também criticou o juiz Sérgio Moro, condenador de Lula em primeira instância, apontando sua “parcialidade” na condução do processo.
O primeiro dos desembargadores a votar foi Gebran Neto, o segundo foi Leandro Paulsen, revisor do processo e presidente da 8º turma do TRF-4, e por fim votou o desembargador Victor Laus. Das 10h30 até por volta das 17h30 – com algumas pausas – o trio leu seus votos destacando os pontos do processo de mais de 250 mil páginas que os fizeram optar pela condenação. Segundo o trio, Lula teria, sim, recebido propina da empreiteira OAS na forma de um apartamento triplex no Guarujá. Eles também acreditam que o apartamento em questão está registrado em nome da OAS, que figura como um laranja do verdadeiro titular, o ex-presidente. Eles acreditam ainda que a transferência apenas não foi feita por causa das investigações que já aconteciam.
“Há prova acima da dúvida razoável que o triplex estava destinado a Lula como vantagem, apesar de não transferido em função da Lava Jato”, disse Gebran. Os desembargadores declararam também que a propina foi oriunda de um esquema de corrupção na Petrobras e que o dinheiro saiu de uma conta da OAS que abastecia o PT em troca de favorecimento da empresa em contratos na Petrobras. O magistrado também defendeu a atuação do juiz Sérgio Moro, cuja imparcialidade foi contestada pela defesa, apontando sua especialidade em crimes de lavagem de dinheiro, e portanto, sua competência e aptidão para julgar o caso.
Já o aumento da pena foi proposto primeiramente pelo relator João Pedro Gebran Neto, tendo como justificativa que o tempo mínimo de prisão era pouco pela gravidade dos crimes cometidos e pelo agravamento de ser o julgado um ex-presidente da República. Ele foi seguido pelos demais desembargadores que também votaram nesse sentido.
RECURSO
A defesa de Lula irá recorrer da sentença, conforme divulgado pelo advogado Cristiano Zanin. “A defesa vai se utilizar de todos os meios legalmente previstos para impugnar a sentença proferida hoje porque a decisão condenou uma pessoa que não praticou crime”. Os advogados do ex-presidente irão aguardar, entretanto, a publicação da decisão para avaliar o melhor meio para impugnar a sentença.
Porém, como a decisão dos desembargadores foi unânime, os recursos são mais limitados do que seriam em caso de um 2 a 1, por exemplo. O recurso disponível nesse caso são os chamados embargos de declaração. Eles não revertem a condenação, mas podem esclarecer ambiguidades, pontos obscuros, contradições ou omissões no acórdão (documento que oficializa a decisão), diminuindo a pena.
Além disso, a defesa do ex-presidente também poderá tentar inocentar Lula nas instâncias superiores (Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal). O problema disso é que os desembargadores determinaram a prisão do condenado após o esgotamento de recursos no TRF-4. Dessa forma, concluído o julgamento dos embargos no TRF-4, poderá ser expedida ordem de execução de sentença. Nesse caso, mesmo que recorra ao STJ e depois ao STF, Lula já poderá estar preso.
ELEIÇÕES
Em relação às eleições, uma eventual candidatura de Lula à presidência, na eleição de outubro, pode ser impedida com base na Lei da Ficha Limpa, que considera inelegíveis aqueles que tenham sido condenados por órgão judicial colegiado. No entanto, há uma brecha, conforme juristas, na lei que permite solicitar uma liminar (decisão provisória), o que garantiria o registro da candidatura.
Zanin, advogado de defesa apontou ainda na quarta-feira, após o fim do julgamento, que “a questão da Lei da Ficha Limpa, se for o caso, será debatida no âmbito da Justiça Eleitoral”. Em nota oficial divulgada pelo PT e assinada pela presidente Gleisi Hoffmann, o partido também garantiu que “vamos confirmar a candidatura de Lula na convenção partidária e registrá-la em 15 de agosto, seguindo rigorosamente o que assegura a Legislação eleitoral”.
Sempre há a possibilidade, porém, de que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) negue o pedido de liberação da candidatura. Nesse caso o partido de esquerda terá que buscar um novo nome para a corrida eleitoral. Ciro Gomes (PDT), Manuela D’Ávila (PCdoB), Fernando Haddad (PT) e Jaques Wagner (PT) são alguns dos cotados.
LULA
Lula, que veio a Porto Alegre para participar de algumas manifestações na noite de terça-feira, mas voltou a São Paulo na manhã de quarta-feira, discursou ainda durante o julgamento na sede do Sindicato dos Metalúrgicos em São Bernardo do Campo e disse estar tranquilo. “Eu tô com a consciência do que está acontecendo no Brasil e tenho certeza absoluta que não cometi nenhum crime”, declarou.
Durante seu discurso ele também apontou que iria continuar recorrendo caso o resultado esperado não fosse alcançado. “Se vai acontecer ou não eu não sei, mas a única coisa certa e justa seria isso. Se não acontecer teremos muito tempo pela frente para tentar mostrar o equívoco e as mentiras contadas contra o PT e o Lula”, disse o político.
Na noite de quarta-feira, após o fim do julgamento, Lula voltou a fazer um discurso na Praça da República, no Centro da capital paulista, diante de cerca de 50 mil pessoas. “A decisão eu respeito. O que eu não é aceito é a mentira pela qual eles tomaram a decisão. Eles sabem que eu não cometi um crime”, declarou.
MANIFESTAÇÕES
Em todo o país, especialmente nas grandes capitais, foram registradas manifestações pró e contra o ex-presidente, porém, Porto Alegre, onde o julgamento ocorreu, foi o principal ponto de concentração de manifestos.
Pessoas de todas as regiões, incluído políticos, participantes de movimentos nacionais e jornalistas, começaram a chegar na cidade ainda no fim de semana. A estimativa, ainda na segunda-feira, era de que mais de 500 mil pessoas passassem pela capital gaúcha nessa semana em função do julgamento. O número oficial, porém, não foi divulgado nem pela Polícia e nem pelos organizadores das manifestações.
Ainda na noite de terça-feira, dia 23, diversos atos foram registrados, alguns deles com a participação da ex-presidente Dilma Rousseff, os ex-governadores do Estado Tarso Genro e Olívio Dutra e da senadora e presidente do PT, Gleisi Hoffmann. Estima-se que mais de 50 mil pessoas tenham participado.
Já na quarta-feira, um dos principais pontos de encontro foi o Anfiteatro Pôr-do-Sol na orla do Guaíba, onde um acampamento estava montado desde domingo. Também houve uma caminhada, logo cedo, pelas Avenidas Antônio de Carvalho, Bento Gonçalves, Farrapos, Borges de Medeiros e Ipiranga. Após o fim do julgamento não foi diferente. Manifestantes favoráveis à condenação de Lula comemoraram a decisão do TRF-4 em diversos pontos da cidade, mas especialmente na Avenida Goethe, no entorno do Parque Moinhos de Vento.
SEGURANÇA
Durante toda a quarta-feira, forças de segurança isolaram a região em torno do tribunal. Houve bloqueio e patrulhamento aéreo acima do prédio do TRF-4 e também aquático no Guaíba, já que o TRF-4 fica próximo à margem. Ruas do entorno também permaneceram fechadas desde a terça-feira. Apesar de terem sido registradas algumas situações irregulares, como a presença de um barco com um boneco inflável do ex-presidente, e a aproximação de algumas pessoas das barreiras de contenção, nenhum confronto sério foi registrado durante todo o dia. Mais de 2,2 mil policiais militares trabalharam no patrulhamento das ruas e no acompanhamento dos manifestantes. O acontecimento foi considerado tranquilo e pacífico.
* Com informações da Agência Brasil