Luciana Mandler
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Quem vive da agricultura sabe o quanto é desafiador e difícil ter o devido reconhecimento. Além disso, outro fator que faz com que famílias repensem a forma de trabalhar é a não permanência no campo. Devido às dificuldades e falta de incentivo, os jovens não pensam mais em seguir com o trabalho na lavoura iniciado pelos pais e avós.
É cada vez menor o número de jovens que permanecem no campo. Em contrapartida, aqueles que ficam buscam melhores condições para suas famílias. É o caso das jovens Elisângela Goetze, de 27 anos, moradora de Sinimbu, e de Karolini Horbach, que completou 20 anos nesse domingo, 28, e reside na localidade de Boa Vista, interior de Santa Cruz do Sul.
Elisângela, desde os 13 anos, produz trabalhos manuais. “Minha mãe me apoiou muito e incentivou para que eu procurasse a vizinha para fazer crochê”, lembra. Desde então, a jovem confecciona itens através do crochê, pintura em tecido, pintura em lata, artesanato em material reciclado como litrão, pintura em madeira, pintura em porongo, patckwork, cipó, fibra de bananeira e pintura em vidro.
Para empreender, inicialmente a jovem conta que não foi fácil, pois não tinha muito dinheiro para começar. “Aí fui colher fumo nos vizinhos para poder comprar o material, e muitas vezes a minha mãe acabava dando dinheiro para que fosse possível comprar o que precisava para aprender”, recorda. “Depois fui questionada por ser jovem e entrar na associação, porque todos nós sabemos que existe estatuto com regras e devemos cumpri-las. Mas com muito diálogo e pessoas que confiaram consegui entrar e ter um lugar no mercado”, acrescenta. “Até nos dias de hoje as pessoas se espantam quando veem uma jovem fazendo artesanato”, completa.
Devido a sua persistência, Elisângela conquistou seu espaço. “Como todo mundo sabe, viver na agricultura não é fácil. Meus pais não tinham muitas condições então decidi vender artesanato”, recorda. Inicialmente, a jovem foi oferecendo para os professores e funcionários do colégio. “E assim foram surgindo encomendas”, diz. “Quando estava no 2º ano do Ensino Médio, uma professora me perguntou se eu não queria ajudar uma tia dela que tinha como renda o artesanato. Na época, fui trabalhar com a uma senhora idosa, dona Dorotéia Jackert. Fiquei até os meus 19 anos trabalhando, fazendo crochê para ela”, completa. Dona Dorotéia lhe pagava, e assim Elisângela conseguia pagar suas contas sem estar pedindo dinheiro para seus pais.
A jovem moradora de Sinimbu relata que queria terminar os estudos, pagar sua habilitação com esse dinheiro e queria se manter sem precisar pedir dinheiro aos pais. “Com 19 anos também fiz as minhas primeiras feiras e quando completei meus 18 anos fiz minha habilitação e meu pai acabou comprando um carro”, relembra orgulhosa. “Meus pais têm muito orgulho. Estão sempre do meu lado”, frisa.
Graças a esse incentivo dos pais, Elisângela participa de feiras como Brique da Praça, Exposin, feiras onde o Município convida, Oktoberfest, Festa das Cucas, Dia Internacional da Mulher promovido pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais e Expoagro. A jovem artesã diz que foi na Expoagro onde recebeu mais visibilidade. “Você acaba sendo conhecida pelo seu trabalho”, salienta. “Sempre tentei diversificar os meus produtos não trazendo coisas repetidas, mostrando a capacidade de inovação que o artesanato tem. Ganhei assim muitas encomendas de outros municípios e vendas para fora do Estado”, reflete.
Elisângela é filha única e mora com os pais. Por eles terem problemas de saúde e precisarem de atenção, optou por ficar em casa. Apesar de ser jovem, ela tem muitas responsabilidades e destaca sobre a importância da mulher frente ao empreendimento familiar. “Penso que todas as mulheres deveriam encarar mais a vida com menos medo e com mais atitudes, porque são elas que sempre vão estar à frente de tudo em casa ou nas propriedades. Tocar um empreendimento jovem e sendo mulher às vezes não é fácil, pois quando chegamos em casa temos animais e a propriedade para tocar mas não podemos nos abalar”, reflete.
A artesã revela que sempre escutou seus pais dizerem que mesmo sendo mulher deveria ser independente, sem necessitar de homem, ter a própria renda. “Às vezes, as pessoas não entendem tamanha independência, porque muitos ainda estão ligados aos costumes de que a mulher é o segundo plano. Porque é o homem que tem que pegar à frente, mas muitas vezes acabamos nos acomodando. Ter a sua renda e ter a sua opinião não é um ato de rebeldia, mas sim um ato de ser guerreira, pois vejo muitas lideranças mulheres em nossa sociedade que são apontadas como se não tivessem o que fazer em casa. Porém, são mulheres de lideranças que vão mostrar para a nossa sociedade que todos são iguais e que podemos tocar o empreendimento e a família”, finaliza.
A PAIXÃO PELO CAMPO
Para Karolini Horbach, o lugar de mulher é onde ela se sente bem, fazendo o que gosta de verdade, “assim, ela também obtém uma renda para ela”, frisa ao destacar sobre a importância da mulher no campo. “Minha família sabe que não vou sair do campo, pois gosto de estar aqui, em meio aos animais e fazendo os produtos”, acrescenta a jovem, que já auxiliou a família na produção de hortaliças e hoje foca na produção de panifícios.
Ela conta que a produção de hortaliças ocorreu em 2018, quando ingressou na Escola de Família Agrícola de Santa Cruz do Sul (Efasc) e de panificação. Naquela época comercializava repolho, beterraba, alface, pepino, cebola, temperos (salsa e cebolinha) e na parte de panificação, em que segue comercializando até hoje, produz cucas, pães (aipim, milho, integral), bolos, cueca virada, waffer, pastel e pizzas, bolachas e geleias.
Karolini conta que quando ingressou na Efasc, comercializava os produtos na feira da escola. “Foi ali que percebi que através das vendas dos produtos poderia surgir uma renda extra para a família”, aponta. Focada na parte de panificação juntamente com a mãe, que soma 40 anos de feira rural em Santa Cruz do Sul, e começou por meio da avó materna, que comercializava seus produtos de panificação, hoje, devido à idade passou para a filha e após algum tempo, Karolini ingressou nessa jornada. “Hoje comercializamos nossos produtos na feira rural central e também participo da feira jovem criada por egressos da Efasc”, salienta.
Vinda de família que produzia hortaliças, sempre foi incentivada e sempre teve apoio. “A minha família é a que mais me apoia nesta caminhada, e a família quer que eu continue fazendo isso, pois sabe o quando eu gosto de produzir os itens e vender junto com minha mãe”, sublinha.