Que o Brasil vem sendo historicamente um dos países com maior desigualdade econômica e social do mundo, isso boa parte do povo brasileiro sabe. Que as desigualdades diminuíram um pouquinho nos últimos anos, a partir das políticas sociais e da ascensão de cerca de 40 milhões de pessoas à chamada Classe C (baixa classe média), muita gente sabe. O que pouca gente consegue é entender os mecanismos que asseguram os privilégios dos ricos e super-ricos.
Um desses mecanismos é o formato dos impostos que pagamos. No Brasil, os impostos sobre o consumo, que todos pagam, pesam muito mais na arrecadação dos governos do que os impostos sobre lucro, propriedade e renda. Por isso, os pobres (que consomem, mas têm pouca renda, pouca propriedade e nenhum lucro) pagam proporcionalmente muito mais imposto que a classe média, que por sua vez paga muito mais imposto que os ricos e super-ricos.
Pesquisadores do IPEA têm alertado para o significado de uma das leis mais injustas, que só existe aqui e na Estonia: a Lei 9.249/1995, criada no primeiro governo Fernando Henrique Cardoso, que isenta de tributação lucros e dividendos de acionistas de empresas. Até 1995 havia tributação. A justificativa para a isenção, à época, foi evitar que o lucro já tributado na empresa, que paga Imposto de Renda da Pessoa Jurídica, fosse novamente taxado quando se convertesse em renda pessoal, com a distribuição de dividendos. Essa isenção faz com que grande parte do que ganham os ricos não seja tributada, explicaram os pesquisadores em audiência no Senado há poucos dias.
Os dados colhidos pelos pesquisadores mostram que os 71.440 brasileiros que ganham mais de R$ 1,3 milhão por ano pagaram apenas 6,7% sobre toda a sua renda. Para fins de comparação, pessoas de classe média com renda entre R$ 162,7 mil e R$ 325,4 mil pagaram em média 11,8%.
O mais impressionante é que todo o déficit do orçamento de 2016, na ordem de R$ 32 bilhões, seria coberto com o fim dessa lei esdrúxula. Mediante a cobrança de imposto de 15% sobre lucros e dividendos, o governo teria uma arrecadação adicional de R$ 43 bilhões ao ano, calculam os economistas do IPEA. Não precisaríamos de cortes de despesas sociais nem de outros impostos.
Trata-se de uma pauta política fundamental para o desenvolvimento do país. A injustiça tributária é indiscutível, a nossa matriz tributária é regressiva: quem tem mais paga menos, quem tem menos paga mais – o oposto do senso de justiça social.
O que se vê nas ruas é um grande desconhecimento, para a alegria de milionários que querem um país de primeiro mundo pagando quase nada. Muitos pequenos empresários e trabalhadores fazem coro com mega-empresários quando deveriam apoiar projetos de lei que já tramitam no Congresso prevendo a tributação dos dividendos, excetuando empresas que participam do Simples Nacional.
Em lugar de um “impostômetro” precisamos de um “injustômetro”. Ao invés de criticar genericamente a nossa alta carga tributária, precisamos medir as injustiças e superá-las.