O Presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, está mostrando no dia a dia uma impressionante vocação ao atraso e ao retrocesso. Após ser derrotado há poucos dias na sua pretensão de mudar as regras eleitorais com o chamado “distritão”, conseguiu êxito inicial em aprovar uma emenda à Constituição permitindo doações de empresas para partidos políticos. Se a emenda for referendada em novas votações no Congresso, os empresários ficam autorizados a utilizar dinheiro das empresas para apoiar partidos, que os repassarão, por decisão interna, aos candidatos a cargos eletivos.
As doações de empresas a partidos e candidatos são sabidamente uma das fontes de corrupção. O importante neste momento é que os cidadãos dialoguem com os deputados que elegeram e solicitem o posicionamento contrário à medida obscura do financiamento empresarial de campanha. Como eleitores, somos co-responsáveis pelas posições de quem elegemos.
O professor Bernardo Sorj, da Universidade de São Paulo, escreveu um belo texto sobre o assunto, intitulado “Empresas não votam”. Transcrevo alguns trechos por serem de insuperável clareza e boa argumentação.
“Não há razão para que empresas doem a partidos, candidatos ou campanhas. Empresas não são cidadãos nem possuem título eleitoral.
Se empresas podem fazer doações, então, por que não podem simpatizar com mais de um partido, como ocorre com muitos eleitores? O que fazer quando a empresa tem dois ou mais proprietários que têm diferentes orientações partidárias?
As empresas cotadas na Bolsa devem levar em consideração as opções de todos acionistas ou devem decidir em assembleia a quem doar?
Do ponto de vista prático, a proposta igualmente não faz sentido: concentrar as doações em um só partido não significa que as empresas não venham a usar seus aportes para, posteriormente, influenciar parlamentares ou membros do Executivo. Aliás, se for para doar para um partido só, o mais obvio é que o façam para o PMDB, que estará na base de qualquer governo.
Não há nenhuma razão para que empresas façam doações para candidatos, partidos e campanhas eleitorais. Empresas não são cidadãos nem possuem título eleitoral. Seus objetivos são econômicos: produzir lucro para os proprietários, gerar emprego e crescimento.
A definição do projeto de lei do novo Código Comercial diz: “A empresa cumpre sua função econômica e social ao gerar empregos, tributos e riqueza, ao contribuir para o desenvolvimento econômico da comunidade em que atua”.
Quando doa para uma campanha uma empresa destrói o princípio da representação, pois o candidato eleito, no lugar de responder ao conjunto de seu eleitorado, é capturado e privatizado pelos seus financiadores. Por isso doações de empresas foram banidas na maioria dos países democráticos.
O empresário, enquanto cidadão, tem direito a fazer doações, mas não deveria haver a possibilidade de dedução do Imposto de Renda, já que parte dos recursos doados estariam sendo financiados pelo resto da população. E, é claro, essas doações teriam um teto, que não permitisse a transferência da desigualdade econômica para a política.”
Em síntese: doação eleitoral é coisa de quem vota, o cidadão.