Todas as vezes que me proponho a escrever sobre algum tema relevante dentro do universo humano a partir do meu entendimento técnico como psicólogo, procuro abordar não só assuntos relevantes, mas me questiono também sobre a influência que terá sob o leitor. Não foi diferente desta vez, quando li uma reportagem sobre um experimento publicado na revista científica Science, onde aponta que 93% do comportamento humano é previsível.
Tenho a estranha e crescente impressão de que nossa vida está cada vez mais guiada por uma busca de explicações. Mas não qualquer tipo de explicação. Buscamos informações que nos permitam saber a causa, a origem, o como acontece. Se pensarmos bem, remete a mais tenra infância: o vaso apareceu quebrado, quem foi?
Desde cedo aprendemos que, no convívio social, deve-se sempre achar o culpado e isso se reflete em tudo aquilo que buscamos hoje em dia em nossa sociedade. Talvez, de fato, essa seja a única previsibilidade do nosso comportamento: a busca incessante por explicações.
Em um relacionamento amoroso, nunca fugimos de achar o culpado pela briga, ou mesmo, o culpado pelo fim. Quantas vezes acusamos nossos pais pelo estado em que nos encontramos atualmente? E o chefe, sempre culpado pela nossa infelicidade e miséria no trabalho. Achando o responsável nos habilitamos à segurança, afinal, já sabemos a causa do que nos acontece. Achar esta causa é uma busca humana.
Não é à toa que muitas vezes nos voltamos aos psicólogos à procura das respostas dos nossos problemas. A figura do especialista parece guardar todas as explicações misteriosas sobre o ser humano e as causas dos comportamentos misteriosos. Mas, como dar minha opinião sobre o comportamento humano se eu não acredito em causa e efeito?
Se não tenho uma explicação causal, como opinar sobre qualquer coisa que envolva o comportamento humano? Falar coisas como “deve-se observar a pessoa” ou “a partir do seu entendimento sobre o assunto” parecem vagas e nada científicas. A busca pela causa é atendida com palavras mais fortes e precisas como “nós somos desta maneira” ou “agimos assim porque…”. O que dizer sobre o comportamento humano, sem oferecer falsas explicações causais?
Resumidamente, a reportagem explicava que a pesquisa se baseou em dados anônimos coletados com operadoras de celular, mostrando que as variações nos deslocamentos das pessoas não eram aleatórias, ao contrário, seguiam um padrão. Desta forma, em 93% das vezes, se poderia de fato prever onde uma pessoa estaria em um determinado dia e horário. A pesquisa confirmava o senso comum que diz que a vida no dia a dia não sai da rotina casa-trabalho.
Talvez a única coisa que eu possa dizer sobre o comportamento é que sua previsibilidade está apenas nesta busca pelas causas, pela resolução rápida daqueles mistérios que causam efeitos em nossa vida, em nossos atos e comportamentos em geral. Claro que aí surgiria a pergunta: porque buscamos pelas causas? Minha vontade seria responder: não sei. Ao invés disso direi algo mais bonito: nossa existência só se efetiva em nossas escolhas, existimos em nossa realização diária de nossa liberdade, escolhendo nossos caminhos.
Buscar as causas e os culpados pode ser uma maneira de lutarmos contra a obrigação de escolhermos, contra essa responsabilidade que nos recai constantemente. Temos de escolher, e somos responsáveis por nós mesmos. Parar de buscar causas é o primeiro passo para se assumir como existente, como responsável.
*Psicólogo, pós-graduado em psicologia clínica