EVERSON BOECK
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É em Seul, na capital da Coréia do Sul, que mais de 30 milhões de produtores de fumo de todo o mundo poderão ter suas vidas impactadas. No Brasil, cerca de 200 mil famílias estão atentas às notícias do que está sendo discutido na 5ª Conferência das Partes (COP 5), da Convenção-Quadro para o Controle de Tabaco (CQCT). No entanto, nenhum membro da comitiva de autoridades e lideranças do setor fumageiro que está em Seul pôde ter acesso às tratavivas, porém a delegação espera ao menos poder ser ouvinte das discussões de hoje até sábado. Enquanto isso, os representantes brasileiros se movimentam externamente.
Até o momento, as informações estão sendo transmitidas por correio eletrônico pelo secretário da Associação dos Fumicultores do Brasil (Afubra) e presidente da Câmara Setorial da Cadeia Produtiva do Tabaco, Romeu Schneider, e pelas assessorias aqui no Brasil dos deputados Heitor Schuch, Marcelo Moraes, Adolfo Brito e Pedro Pereira.
Interferência no plantio e limitação de área
No primeiro dia, de acordo com Schneider, houve um encontro com o ministro-conselheiro da embaixada do Brasil na Coreia, Sergio Luis Lebedeff Rocha, onde também estavam presentes o presidente da Afubra, Benicio Albano Werner, e o prefeito de Venâncio Aires, Airton Artus. “A posição dele foi muito clara, ou seja, não permitir que haja interferência no plantio e limitação de área, mas continuamos preocupados porque o tema é motivo de discordância entre os países presentes em Seul, pois não há unanimidade, principalmente pelo fato do assunto ser contrário à própria recomendação do artigo 17, que trata sobre o assunto”, frisa Romeu.
Sérgio Lebedeff ouviu atentamente as ponderações da comitiva brasileira, declarando que a posição governamental segue basicamente a mesma direção. “A posição brasileira deverá ser mantida até a votação final”, destacou o chefe da delegação. Conforme o deputado Adolfo Brito, a expectativa da comitiva é positiva para o encaminhamento final da COP 5. “Uma coisa ficou certa dessa reunião: não deverá haver recomendação para redução da área plantada”, comemora o parlamentar.
Ricardo Scussel Lonzetti / Divulgação AL
Integrantes da comitiva em Seul, na Coreia do Sul, se movimentam
em favor do setor no Brasil
Mercado ilícito
Os dois primeiros dias foram marcados por discussões sobre mercado ilícito e embalagens genéricas. A ideia, explica Schneider, é disseminar a medida tomada pela Austrália, de banir as marcas de cigarros. Tambem houve debates sobre o artigo 6 da Convenção Quadro, que aborda o aumento de impostos e taxas. “A maioria tem pensamento semelhante, achando que o preço afasta o consumidor”, explica. Para o dirigente, no entanto, a majoração excessiva, caso aconteça, vai levar o consumidor para a ilegalidade.
O comércio ilegal é motivo de preocupação em todo o mundo. Dados fornecidos no evento sugerem que 10% a 15% do consumo advêm do contrabando. No Brasil esse número sobre para 30%. “É um dado que preocupa e que ano a ano traz prejuízos aos cofres públicos”, comenta o presidente do SindiTabaco (Sindicato Interestadual da Indústria do Tabaco), Iro Schünke. Nos próximos dias outras questões serão discutidas, como a redução da área plantada.
Falta de interlocução
De acordo com o presidente do Sinditabaco, Iro Schünke, a falta de interlocução entre o governo e entidades representativas do setor tem sido o maior problema. “Continuamos alertas uma vez que outras medidas poderão ser aprovadas, como restrição ao crédito e de assistência técnica, provocando a desorganização da cadeia produtiva. Já vimos neste ano tentativas de restrição de crédito ao produtor de tabaco, medida que acabou sendo revogada pelo Banco Central a pedido do MDA e do MAPA. Além disso, a assistência técnica é a base do Sistema Integrado de Produção de Tabaco e responsável direta pela posição brasileira no ranking mundial de exportação e produção de tabaco. Isso porque as orientações repassadas pelas equipes de campo das empresas aos mais de 165 mil produtores integrados na Região Sul garante um produto de qualidade e integridade (tabaco livre de impurezas químicas e físicas), de acordo com a demanda de clientes de mais de 100 países”, explica Schünke.
Ricardo Scussel Lonzetti / Divulgação AL
Delegação brasileira esteve reunida o ministro-conselheiro da embaixada
do Brasil na Coreia, Sergio Luis Lebedeff Rocha
ENTENDA
Para aprovar novas recomendações da Convenção-Quadro para o Controle de Tabaco (CQCT), uma Conferência das Partes, com a participação dos 176 países que ratificaram o tratado é realizada a cada dois anos. O objetivo da CQCT é a diminuição do número de fumantes no mundo e a exposição à fumaça do cigarro. Entretanto, as medidas em debate na Coreia do Sul, estão diretamente relacionadas à produção no campo:
Artigo 17 – Aborda temáticas relacionadas à diversificação (apoio a atividades alternativas economicamente viáveis). “As Partes, em cooperação entre si e com as organizações intergovernamentais internacionais e regionais competentes promoverão, conforme proceda, alternativas economicamente viáveis para os trabalhadores, os cultivadores e, eventualmente, os varejistas de pequeno porte.”
Artigo 18 – Está relacionado à proteção ao meio ambiente e à saúde das pessoas. “Em cumprimento às obrigações estabelecidas na presente Convenção, as Partes concordam em prestar devida atenção, no que diz respeito ao cultivo do tabaco e à fabricação de produtos de tabaco em seus respectivos territórios, à proteção do meio ambiente e à saúde das pessoas em relação ao meio ambiente.
Apesar de os termos se referirem a alternativas economicamente viáveis, o relatório oficial, publicado em setembro, que será apreciado durante a COP 5, traz em seu bojo uma série de sugestões no intuito de reduzir a área plantada e diminuir os benefícios dos produtores e das empresas gerados por meio do Sistema Integrado de Produção de Tabaco – o mesmo sistema que está sob a avaliação do Ministério da Agricultura para receber uma certificação mundial inédita, com selo que atesta a qualidade do produto e a garantia que ele foi produzido em condições sustentáveis. Entre estas sugestões estão:
– limitação ou redução da área plantada com tabaco;
– migração forçada para outras culturas, substituindo o tabaco;
– fim de mecanismos de suporte aos produtores (orientação técnica das empresas);
– limitação de crédito;
– desmantelamento de organismos que promovem o tabaco (entidades que representam os produtores).
Se aprovadas, o Brasil corre o risco de ter esta organização desmantelada e sua produção sendo reduzida e transferida, bem como os empregos e riquezas dela gerados. Países que sequer ratificaram a CQCT, como os EUA, a vizinha Argentina, os africanos Zimbábue e Malaui, e a Indonésia, poderão suprir esta demanda, uma vez que a própria Organização Mundial da Saúde prevê a continuidade do número de fumantes por décadas.