Tiago Mairo Garcia
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Uma entidade que nasceu com o objetivo de representar o produtor rural. Assim começa a história da Afubra, fundada no dia 21 de março de 1955, em Santa Cruz do Sul, e que inicialmente era chamada de Associação dos Plantadores de Fumo em Folha no Rio Grande do Sul. Com foco apenas nos agricultores do Estado, a Associação foi organizada por produtores de tabaco em virtude da carência da união entre os agricultores e, visando os interesses na comercialização de tabaco e de viabilizar recursos para auxiliar os produtores a cobrirem prejuízos causados pelas intempéries climáticas.
Ao longo destes 65 anos de existência a Afubra cresceu e se tornou uma das maiores entidades representativas da classe rural do sul do Brasil. E uma pessoa especial vive diariamente a história da entidade. Filho de Harry Antônio Werner, sócio-fundador e primeiro presidente da Afubra, o atual presidente, Benício Albano Werner, acompanhou todos os passos da entidade. Em entrevista concedia ao Riovale Jornal, o dirigente lembrou detalhes da fundação, destacou os avanços conquistados e projetou os desafios e futuro da entidade em defesa dos produtores de tabaco.
Riovale Jornal – A Afubra celebra 65 anos de história. Como foi o início da entidade?
Benício Werner – A Afubra iniciou com um problema muito sério onde os produtores de tabaco foram atingidos com um grande prejuízo causado pelo granizo nas lavouras em novembro de 1954. Na época, eu morava em Formosa, interior de Vale do Sol e meu pai (Harry Antônio Werner) era vereador e tinha casa comercial. Os produtores atingidos pelo granizo chegaram na casa comercial e como vereador meu pai era uma liderança na comunidade. Como líder, ele se comprometeu em conseguir uma forma para que os produtores pudessem ser ressarcidos pelo prejuízo que vinham tendo com o granizo. Foi o início da criação da Associação dos Fumicultores do Brasil, mas que na época se chamava Associação dos Plantadores de Fumo do Estado do Rio Grande do Sul. Na época não tinha sindicatos e como havia essa necessidade de buscar ressarcimento para os prejuízos causados pelas intempéries climáticas e não havia outra representatividade, a própria entidade criada, iria fazer a representação dos produtores junto aos órgãos públicos, privados e empresas de tabaco. Já se pensou que para o produtor a monocultura era prejudicial e precisava se pensar na diversificação através da criação da entidade. Para a solução do problema do granizo, o problema foi levado até a Câmara de Vereadores de Santa Cruz do Sul e o presidente do Legislativo na época, Patrick Francis Fairon, passou a ser um aliado dos produtores e da própria associação, tornando-se associado e defensor da causa. A partir de 21 de março de 1955 a diretoria eleita da Associação procurou várias companhias de seguros, mas nenhuma quis aceitar o risco. Após procurar o Governo do Estado, através dos seus técnicos, buscou uma forma da própria associação criar um sistema. A partir dai se criou o sistema mutuo que até hoje está funcionando. Lógico que com a modernização, o avanço da tecnologia, mudou. Antes era feito de uma forma. A Associação dos Plantadores de Fumo em Folha não quebrou com esse sistema mutuo, que iniciou em 5 de novembro de 1956, um ano e meio depois da fundação, com o subsídio do Governo do Estado do Rio Grande do Sul através de uma lei que previa auxílio para indenizações de lavouras atingidas pelas intempéries. Como o sistema mutuo da associação era granizo, então os produtores receberam essa indenização do granizo. No início foi difícil, pois poucos produtores acreditaram que isso iria funcionar, assim como as próprias empresas de tabaco que não acreditaram no sistema e também tinha restrição porque estava sendo criada uma entidade que iria representar os produtores. Essa entidade, teria uma força para representar os produtores junto as empresas. Os poucos que se associaram no primeiro ano, um total de 104 produtores, e os que foram atingidos pelo granizo, receberam o seu valor de indenização. O segundo ano já foi melhor. As próprias empresas de tabaco começaram a acreditar no sistema mútuo, os produtores também começaram a acreditar neste sistema. O trabalho da associação era em prol da cadeia produtiva e era ver crescer a produção de tabaco no Brasil e ter resultado para o produtor.
RJ – Nos primeiros anos como a entidade foi se estruturando?
Werner – Na época, antes da fundação, havia muito produtor que tinha dinheiro que recebia das empresas e quando iria comercializar a segunda safra. Ou seja, ele já havia colhido e comercializado a primeira safra e não havia recebido o dinheiro da empresa quando já estava comercializando a segunda safra. Eram questões que faltava uma entidade fazer a cobrança para que as empresas agissem de forma correta com os produtores. Tudo isso foi trabalhoso. Ao mesmo tempo da fundação, como um dos principais objetivos era a diversificação, foi criado um departamento chamado de departamento de fomento agropecuário, que inicialmente vendia somente sementes, fertilizantes, alguns defensivos, porque naquela época eram poucos disponíveis, e também produtos veterinários. Isso só foi funcionar a partir de 1956 junto com o sistema mutualista. Foi crescendo ano a ano e a própria diversificação estava no primeiro estatuto elaborado pelo professor Albino Pedro Sehnen e Padre Emilio Backes e redigido pelo contador Bruno Guilherme Muller, que depois fez a parte contábil da Associação.
Enquanto hoje se fala em diversificação, naquela época o assunto já era abordado. As sementes de milho híbrido, que se chamavam na época, foram introduzidas em Santa Cruz do Sul e região pela própria associação. Outra iniciativa da associação na região foi a introdução da soja como forma de diversificação, inserida pela entidade aos produtores. Até 1963, a associação era somente do Rio Grande do Sul. A principal região produtora era Santa Cruz do Sul e os municípios da região do Vale do Rio Pardo e parte de Cachoeira do Sul, que tinham o fumo secado em estufa, tipo Burlei, da Região Centro-Serra, Cruz Alta e Ijuí, tinham o fumo de galpão comum. Aos poucos, em 60 e 61, as regiões produtoras foram expandindo para outras áreas. Em 1963, a associação expandiu para Santa Catarina e Paraná, motivadas pelas próprias empresas. Um dos exemplos foi a empresa Souza Cruz, que tinham produtores na divisa entre Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Os produtores gaúchos tinham o seguro para o granizo no sistema mutuo e os catarinenses não tinham. Os produtores e as empresas solicitaram que a entidade fosse para Santa Catarina e Paraná, estados que já estavam produzindo o tabaco, fato que acabou se concretizando em 1963.
O boom de crescimento da fumicultura no Brasil aconteceu de 1975 em diante e a associação teve que se adaptar rapidamente, principalmente pelas guerras de independência que estavam ocorrendo na África e lá sempre tinha uma grande produção e de boa qualidade. As empresas multinacionais que estavam atuando lá, todas elas vieram para o Brasil, isso gerou um crescimento muito grande da fumicultura no Brasil e a associação teve que crescer junto na gestão administrativa. Tínhamos 15, 20 mil associados e de uma hora para outra tivemos 50, 60 mil associados e necessitamos nos adaptar a essa realidade. A diretoria da época passou a preparar as equipes técnicas e servidores internos para atuar no sistema mutualista. Foi um período de crescimento e agilidade de gestão da própria associação.
RJ – Quando a Afubra passou a atuar nas questões ambientais?
Werner – Houve períodos que a própria associação teve que assumir questões ambientais. Em 1978 assinou um primeiro documento juntamente com o SindiTabaco, na época chamado de Sindifumo, onde o Governo Federal fez um convênio com a própria associação para que em cinco anos deveria trabalhar em cima de reflorestamento de produção de florestas energéticas. Foi um trabalho em conjunto entre Afubra, SindiTabaco e empresas para que se tornasse realidade. Foi muito difícil a sensibilização do produtor, sendo um trabalho longo.
A Afubra criou o projeto Verde é Vida, onde se trabalhou com as crianças, que conseguiram sensibilizar os pais a se engajarem na ideia, sendo o ponto culminante para que os produtores pudessem aderir à ideia e fizessem o reflorestamento em suas propriedades. Quando estamos fazendo o custo de produção, que fizemos desde os anos 60, tinha-se um parâmetro em que um metro de lenha custava uma arroba de BO1 e hoje o metro de lenha custa bem menos que uma arroba de tabaco. Isso foi o resultado positivo do reflorestamento que aconteceu nas propriedades e que ajudou o produtor a diminuir o custo de produção.
RJ – Como surgiu a Expoagro?
Werner – A diversificação não ficou somente em algumas culturas. Foi aumentando com fornecedores de sementes, fertilizantes, defensivos agrícolas através de dias de campo. Foi uma ideia que se transformou na Expoagro, que iniciamos em 2001 para levar informação e tecnologia para agricultura familiar, transformando o dia de campo em feira. Através de nossas filiais, ainda realizamos os dias de campo junto com os nossos produtores. A Expoagro tem uma dimensão maior, ela consegue reunir técnicos de empresas produtoras de insumos agrícolas e traz pessoas qualificadas que estão em contato direto com os próprios produtores e tiram as dúvidas dos mesmos, sendo importante essa troca de informações entre eles, o que reflete no crescimento da agricultura. Nas primeiras feiras haviam poucos equipamentos para uso na pequena propriedade. Nos últimos seis anos foram criados equipamentos úteis para a pequena propriedade, mostrando o resultado do diálogo existente entre o produtor com as empresas do segmento, valorizando que a feira trouxe para o produtor e para as empresas expositoras.
RJ – A Afubra também avançou na área urbana. A entidade criou lojas e auxiliou no desenvolvimento das cidades. Como o senhor vê esta expansão?
Werner – Inicialmente o produtor rural não tinha tanta necessidade de possuir utensílios domésticos que o cidadão urbano já possuía, porque no interior não havia energia elétrica. Na medida que a energia elétrica foi chegando, o produtor rural também passou a ter essa necessidade de ter o conforto na sua casa com a aquisição de equipamentos eletrônicos. O próprio departamento de fomento agropecuário foi crescendo e levando para o produtor rural o conforto que ele merece e então surgiram as Lojas da Afubra com portfólio que hoje possui mais de 50 mil itens em 23 lojas no RS, SC e PR, duas lojas agrícolas e um ponto de vendas que estão à disposição do produtor. Ainda serão inauguradas mais duas lojas, sendo uma em Jaguari e outra em Arvorezinha. O Departamento de Fomento Agropecuário se transformou na Agro-Comercial Afubra.
RJ – Para o senhor, o que significa ser presidente da Afubra?
Werner – Fui eleito presidente da Afubra pela primeira vez em julho de 2007. Desde a preparação para a fundação em 1954, até o falecimento do meu pai em 1989, o acompanhei nas atividades da entidade e poder, neste momento de 65 anos, estar na presidência, é uma emoção muito forte. Isso não quer dizer nada, se não tivesse, desde o período que meu pai estava na presidência, parceiros, colaboradores, para juntos, administrarem esta entidade. A mesma coisa acontece comigo na presidência, com o apoio de toda a diretoria, dos conselhos e dos colaboradores.
Antes de ingressar na diretoria, entre 1975 até 1983, eu fui um colaborador na associação. A partir de 1983 eu fui designado para a tesouraria da entidade. Uma entidade que na data da sua fundação não tinha uma cadeira. Todas as diretorias, seus conselheiros e o seu forte esteio, os associados, criaram três patrimônios que sustentam a entidade, que é o associado, o corpo de colaboradores e a administração. Esse esteio que trouxe desde 1955 a Afubra para aquilo que ela é hoje, e essa responsabilidade destes três esteios, que vai continuar levando a entidade para frente. O sucesso que a entidade tem, é o sucesso de todos nós e a alegria da gente estar na presidência precisa ser compartilhada com toda a diretoria e colaboradores que a Afubra compartilha.
Hoje temos parceria com seis federações, representantes dos trabalhadores rurais, que desde 1980, tem uma comissão formada que trabalha na defesa dos produtores de tabaco. Temos parcerias com as prefeituras dos municípios produtores, que fazem um belo trabalho com o Projeto Verde é Vida. Temos parcerias com os Estados, através das secretarias estaduais, e temos convênios na esfera federal com a Embrapa para desenvolver projetos. À todas essas parcerias precisamos saber compartilhar esse sucesso. As decisões que tomamos dentro da Afubra são tomadas em diretoria e muitas são decididas com os conselhos deliberativo e fiscal, porque decisões tomadas individualmente correm o risco de serem erradas. Este é mais um ponto forte das administrações da Afubra.
RJ – Quais os desafios da Afubra para o futuro?
Werner – O mercado procura um produto de qualidade e um dos desafios é sempre conseguir produtos de qualidade. No que depende do nosso produtor, nós temos condições, mas o clima é determinante e o exemplo é o que ocorreu neste ano durante a safra. Outro ponto determinante é a oferta e demanda. Nós estamos tendo o desafio muito grande com relação à restrição ao uso do tabaco no cigarro. Estamos a cada ano vendo sempre a queda no consumo. Isso nos leva a uma encruzilhada e essa encruzilhada pode nos conduzir ao mesmo caminho, mas precisa ser bem conduzida. Como entidades, a Afubra e federações precisam da sensibilidade e compreensão do nosso produtor. Precisamos produzir aquilo que o mercado quer, mas precisamos produzir e ofertar o que o mercado precisa e isso está difícil à compreensão do produtor, porque lá na ponta, a nossa matéria-prima está sendo cada vez menos necessária e precisamos diminuir ela para ter uma paridade entre oferta e demanda na hora da comercialização com um preço que traga resultado para o produtor. O segundo caminho para chegar no mesmo resultado, que é a lucratividade da propriedade, é o produtor apostar na diversificação. A propriedade precisa ser diversificada e as opções a gente oferece muito claramente na Expoagro, onde o produtor tem diversas opções nos estandes para fazer as suas escolhas. Tendo mais uma atividade na sua propriedade, ele vai conseguir chegar a ter bons rendimentos para o seu sustento. É um desafio que temos. Precisamos de apoio das federações para que a gente consiga fazer com que o produtor se sensibilize de que estamos no limite máximo de produção no Brasil e precisamos diversificar a propriedade para que possamos fazer com que ele se mantenha no meio rural.
Também contamos com o apoio das secretarias municipais, sendo uma união de esforços entre todos. Tecnologicamente a Afubra evoluiu. Primeiro era papel, depois maquina de calcular e demais formas. Hoje o pessoal de campo atua com equipamentos tecnológicos nas lavouras. Terminou o dia, ele se conecta com o servidor da matriz e repassa todas as informações, no dia seguinte já sabemos se teve de prejuízos nas lavouras. Desenvolvemos tudo internamente, tanto o sistema comercial e da mutualidade. A Afubra evoluiu na área tecnológica em todos os setores para acompanhar a evolução e o crescimento da entidade. Hoje, o sistema que temos à disposição, foi a própria Afubra que desenvolveu com o auxílio de profissionais terceirizados, especialistas na área de informática, que auxiliaram no desenvolvimento interno do sistema da empresa. Como em alguns locais ainda não há sinal de internet, ainda temos enviado mensagens de SMS para os produtores que estão no cadastro. É um desafio para o futuro onde a conectividade precisa estar cada vez mais presente.
RJ – Que mensagem o senhor deixa para o associado da Afubra?
Werner – Precisamos dizer para o produtor acreditar mais e trabalhar com a tecnologia. Nós não podemos depender somente do clima. Aquilo que com a tecnologia nós podemos resolver, precisamos investir na propriedade, precisamos acreditar nas instituições que representam os produtores. Muitas vezes o trabalho destas entidades é dificultado por forças que parecem ocultas, mas não são tão ocultas. São governos com direções e objetivos diferentes que o setor primário precisa ter. Cada vez mais os produtores precisam se unir em prol das suas instituições.